domingo, 11 de outubro de 2015

(Parte 43) Insanidade


Estava consciente. Como, ela não fazia a mínima idéia. Parecia estranho sendo que sua última visão turva era a de Nikolai se aproximando de seu corpo. Acreditou ter morrido durante o confronto na ponte. Algo bem estranho, pois na verdade tinha plena certeza desse fato. Havia falecido devido a uma flecha em seu pescoço. E alguma coisa estava realmente errada ali.
Nada daquilo fazia sentido. Já que além de não estar morta, sem ela querer estava uma vez mais diante do Portal da Verdade. Aquilo nem passava mais na cabeça da jovem. Seu corpo estava perfeito, com a roupa que havia tombado e sem nenhum corte. Além que nenhum sangue ou ferida surgia em seu corpo. Era como em toda a vez em que esteve naquele lugar. Como se as forças externas nunca existissem ali. Nem tempo, nem espaço. Algo estava diferente, no entanto. Seu instinto parecia zunir com aquela sensação. Como se aquilo fosse errado. Extremamente.
Notou que o Portal estava entre aberto. Um tentáculo se escondia atrás dele. E não parecia com nada que já viu.

Mesmo achando que o mago mascarado, muitas vezes agia de modo sombrio, aquilo parecia nenhum pouco ser obra dele. Será que existiria mais um mestre que ascendeu recentemente, foi o primeiro pensamento que lhe surgiu. Um que talvez não conhecesse ou que abriu recentemente aquele caminho de revelações. Independente de quem fosse a sua chegada ali trazia certo receio. Um grito na alma de Halphy parecia surgir como um aviso de alerta. Nunca houve tão poucas opções, no entanto. Menos do que em qualquer outra situação.
O perigo era claro e óbvio. Nada poderia fazer. A não ser entrar por aquela porta sinistra, como já fez antes. Se tentasse voltar ao mundo normal poderia morrer instantaneamente foi o que concluiu. Ao menos é o que imaginou aquela jovem perdida. E não queria comprovar tal teoria.
Enfim ela empurrou a porta de pedra. Lá não havia luz de estrelas ou a escuridão de um céu noturno convidativo. Existiam chamas de vela, em aparelhos de cobre preparados para tal e o breu de algo sombrio.
Começou a enxergar certas coisas. Antes não pudesse ver.
Inicialmente notou um gato de pé com duas caudas. Seus olhos eram de um animal. Só que eles se moviam quase que com malicia de um homem. Era estranho e bizarro. Nem tanto quanto seus companheiros.
Outro ser parecia com uma mulher. Usava um manto cobrindo seu corpo, com uma faixa vermelha em sua barriga. O detalhe eram seus longos cabelos negros, que pareciam formar braços e mão com seus fios finos. O pior era notar que da nuca dela uma bocarra grande surgia.
Que coisas todas eram aquelas? Estaria no Inferno? Mal sabia ela que estava próxima disso.
Uma das formas lembrava mais um fantasma. Translúcido, sombrio, cruel e maligno em sua imagem. Sua expressão lembrava mais os olhos de uma raposa. Como os de Yue Khan que servia ao Bando do Tigre Demoníaco. Agora que pensou para analisar tais seres notou alguns com expressões parecidas com o daquele homem.
Começou a compreender o ocorria ali? Eram seres que provinham do extremo leste.
Todos bizarros: cabeças em rodas, espadas flutuantes, mulheres com metade de seus corpos como os de uma aranha, animais com aspectos humanos, criaturas que vagamente lembravam ogros, raposas de várias caudas, hominídeos com cabeças de cavalos, criaturas que lembravam mortos sem descanso, todos com formas únicas e que só uma mente conseguiria conceber. Pois Halphy sabia que aquilo nunca seria um sonho. Ou sua morte. Todos – quando possuíam olhos ou ao menos uma face – com uma expressão sombria a encaravam, mas não se aproximavam.
Eles assim mesmo, concedem espaço para a jovem caminhar. Criando uma trilha para ela. Era como um animal para o abate ou um cordeiro. Agora entendia como os cristãos sempre pensavam. Tudo fazia mais sentido. Pois sabia... O mal verdadeiro estava na sua frente.
Enfim, ela encontrou o ser que controlava o lugar. Lembrava tanto o corpo de uma imensa serpente, como a pele do estranho Long que a havia encontrado antes. Ainda assim, era possível sentir todo o odor de um forte enxofre naquele recinto diferente. A face do ser lhe surgiu como um demônio, ou quase isso. Era um dragão com muitos traços de uma cobra medonha e apavorante. Esse ser único, com certeza era o poderoso Yo-Long, um novo mistério para Halphy.
-Acredito que não preciso me apresentar...
-Mas os bons costumes ditam que você deve se apresentar.
Uma parte da garra surgiu na sua frente. Só aquele pedaço do imenso ser era o triplo do tamanho da antiga ladina. Havia provocado alguém extremamente perigoso. Sabia disso.
-Não me provoque mulher.
-Que falta o Lacktum faz aqui. Podendo levar um golpe por mim – soltou inconscientemente à jovem – Eu sei que é o Yo-Long. Afinal, você é um dragão ou um deus? Ele não deixou isso bem claro para mim.
-Meu pupilo, Long é um tanto quanto protetor demais. Eu sou sim um ser onisciente e onipotente. Ao mesmo tempo sou um dragão. Compreenda: antes do grande êxodo de minha raça, eu obtive poder suficiente para alterar meu status. De um mero ser com poder arcano entre os de minha raça, e um daymio[1] junto aos mortais humanos... Eu cresci como um deus. Nada, na verdade, ninguém, poderia impedir-me. Especialmente em minhas terras. Só uma princesa feiticeira de uma lenda antiga teria força para me impedir. A última dessa linhagem sumiu. Acho que você não compreenderia mesmo que eu lhe explicasse com toda cautela do mundo. No entanto, um perigoso e famigerado dragão de sangue me aprisionou na Prisão dos Espíritos.
-Por quanto tempo ficou preso.
Dessa vez não era raiva o que Yo-Long soltava. Eram risadas. Ela estava começando a odiar risadas histéricas. Fossem lá quem as fazia.
-Quem disse que me libertei? Isso aqui é uma interpretação de minha alma. Graças a um aliado que me veio em sonhos. Maelstrom.
Esse nome mais uma vez. Era como uma maldição. Ele sempre surgia nas sombras de seu mundo. Através de forças perigosas como as de Sinestro, Hades e agora Yo-Long. A assassina sabia como aquilo parecia. Interligava as tramas de um plano superior. Um mistério era feito através de um mero nome.
De qualquer modo, ela perguntou com receio para aquele ser:
-E o que quer de mim? Estou morta, não é isso?
A cauda da serpente dracônica se enrolou no corpo de Halphy. Sua ponta era cheia de detalhes coloridos. Cobriu tanto a sua pessoa, que só a cabeça era visível agora. Uma atitude, literalmente, sufocante. Os dentes do monstro deus estavam próximos de sua face. Gotejava uma saliva nojenta, enquanto o cheiro de enxofre subia. Nauseante alguém diria. A jovem ainda continuava forte e firme, apesar de tudo.
-Você vai voltar a viver. Eu quero assim. Através do meu poder. Para que posa me libertar. Vá até onde Sinestro irá abrir o Portal Infernal e espere instruções de Long. Caso não faça o exigido a levarei até uma terra de onde provêm essas criaturas. Além do que, preciso que parte do plano do dragão esmeralda funcione.
E sem que ela quisesse, Halphy Brown despertou. De todo aquele pandemônio. Ou melhor, daquele Inferno. Alguns diriam insanidade.

Tossia muito. Acordou fazendo isso com muita força. O que sentiu dentro do Portal da Verdade a afetou fora dele. Isso ocorreu, pois, com certeza era poderoso aquele escamoso. Mesmo com a ajuda do sorrateiro Maelstrom. Sua cabeça girava muito depois de tudo. Literal e figurativamente.
Só quando despertou notava que estava em uma cabana. Bem simples e sem comodidades. Além de parecer ser das Terras Altas. E lembrou que o castelo de Sinestro se localizava no extremo norte daquele território único. Como havia saído do castelo nem fazia idéia mesmo.
Através de uma porta improvisada com pano surgia Nikolai. E os seus olhos do jovem ficaram cheios de água e alegria, nunca antes demonstrada. O alquimista pulou cima de Halphy. Ele a abraçou afetuosamente.
-Eu já o entendi meu amigo. Esta feliz em me ver... Viva.
-Mais que isso! Grato! A todos os deuses que conheço! E pelos quais orei por você! Pois nem imagino qual lhe salvou!
-Acredito que não foi Hades. Tenho quase certeza disso. Mas também não sei se iria orar para qual fez essa façanha.
-Como assim Halphy?
-Nada... Esqueça... Então só me diga... Vejo que não me enterrou. Por qual motivo não o fez? Ou até queimar meu corpo seria uma opção.
Então o jovem se levantou. Com isso a assassina notou estar deitada no chão de terra. Havia palha ali, mas para fazer uma cama improvisada. Ali havia ela e seus itens todos. Com exceção de Slithar-Mor.
-Mesmo estando aparentemente morta, seu corpo ainda pulsava. Nem me pergunte como. Achei estranho, mas com a ajuda de Brigid eu fugi com vocês nos...
-Brigid ainda vive?
-Eu não sei minha querida. Só coloquei você entre meus braços como ela ordenou. Afinal devia ter lhe avisado dos golpes em seu corpo ainda não recuperado. Perdão. Juro que não voltarei a cometer tal erro.
A garota colocou sua mão direita no ombro de seu, atualmente, único amigo. E talvez para sempre.
-Eu que fui irresponsável. Nunca deveria ter me aliado ao Pacto de Guerra. Muito menos atacar como uma louca aqueles seres em forma de armadura. Por Deus como testemunha, eu admito minha culpa meu amigo.
-Deus? – espantou-se o alquimista – Como assim? Nunca lhe ouvi suplicar pelas bênçãos de uma força superior. Muito menos a dos cristãos. Sinceramente você deve estar passando mal. Melhor deitar mais um pouco. Trarei-lhe um chá para lhe acalmar os ânimos.
Halphy esboçou um sorriso curto e tímido. Parecia um pouco mudada em diversos aspectos.
Ela levantou rapidamente tentando tomar fôlego. Notou que já não havia neve naquelas terras por uma janela. O inverno deveria ter partido, a jovem comentou quando olhou pela janela e apontou.
-É... Já faz uns dias.
Saiu da casa com cada equipamento e item que Nikolai guardou. Estava mais que decidida a lidar com Sinestro. Com o dragão do leste se viraria depois. Ao menos achava que conseguiria isso.
-Onde esta Silthar-Mor?
-A Lâmina que Perfura Dragões? Foi capturada durante o combate por um revenant.
Parecia um tanto transtornada. Ela queria levar aquela arma para longe dos olhares de seu antigo mestre. Porém, sabia que onde estivesse nunca se livraria da influência cruel e maligna dele. Pois parte dele, agora fazia um pedaço de seu ser.
Sim. O artefato. Foi para isso que ele a queria. Seus planos macabros estão cheios de crueldade. Uma grande malícia também. Mas qual seu intuito? Com que finalidade um dragão constituiu família? Não haveria motivos de conceder um objeto de tamanho poder para alguém sem motivo. Só agora pensou sobre isso. Como foi tola. Tudo nesse mundo podre e sórdido tinha um preço alto demais para ser pago. E o dela era claro sua própria alma.
Ela colocou sua mão sobre o medalhão da dominação. E começou a apertá-lo com força. O suficiente para fazer com que toda pele ao redor começasse a sangrar. As garras estavam mais projetadas que o normal. A Chama Gélida tinha que sair daquele corpo. Já tinha sido maculada demais pela herança cruel do antepassado.
Nikolai ali, tudo assistia sem nada a fazer. O que poderia fazer? Ele, como tantos estudiosos, ouviu as lendas sobre o que ocorre a quem tenta acabar com um artefato.
Os gritos que a jovem marduk soltava eram agonizantes. Parecia que queria morrer e que logo estaria perto disso. Só que isso nunca chegava. O suicídio seria uma opção caso seus pecados fossem finalmente perdoados. Ela tinha muitos pecados. Precisava os expurgar eles o mais rápido possível.
Ao que pareciam, os planos de Sinestro e Yo-Long para ela, continuavam firmes. Visto que aquele profano ornamento fixado em seu corpo nunca sairia. Maldito sejam os dragões. Como gostaria só de ser uma meio-elfa agora. Talvez se ainda o fosse isso nunca teria acontecido.
Ajoelhou-se fatigada pelo esforço contra o próprio corpo
-Esta bem donzela.
Ela colocou a mão no peito de Nikolai, como uma forma de apoio ao seu corpo machucado. Precisava de um momento para respirar.
-Grato meu amigo.
-Quer se matar minha querida?
-Se essa fosse uma opção...
-Nunca mais repita isso Halphy!
-Ora essa... Não me chamou de Donzela agora.
-Óbvio! – irritado soltou o alquimista – Você parece mudar de humor, como se estivesse mudando um de seus virotes em sua arma.
-Desculpe. É que só queria...
-Se livrar desse item? – completou o jovem.
Ela concordou com a cabeça.
O jovem começou um discurso:
-Acredito que enquanto estamos vivos ainda podemos mudar as coisas. É óbvio que muitas vezes a nossa vida parece nos sufocar. E detalhes parecem nos limitar. Porém, enquanto vivos podemos fazer o que queremos. Mesmo que pareça absurdo. De certa maneira, o que pretendo um dia conseguir seria um absurdo... Compreende o que quero dizer? Tente se livrar desse mal. Só que viva o quanto puder por todos aqueles que não puderam.
A imagem de Jean se fez presente na mente de Halphy, instantaneamente. Entendia o que aquele homem que mexia com um tipo de magia diferente queria dizer.
-Mas e você Laskov? O que pretende com tanto ardor que ainda lhe faz viver para contemplar outro dia? Já que perdeu um grande amor...
Ele soltou um sorriso malicioso. Halphy esperava outra coisa sair daqueles lábios.
-É bem diferente do que você imagina. Eu suponho... Quero enfrentar a fera que tomou a vida de minha amada.
Um vento sombrio bateu no cabelo do jovem. Era como se até o tempo, que começava a ficar mais ameno, soubesse de suas intenções. Halphy sentiu o pior calafrio. Como se uma premonição seguisse aquelas palavras. E ela dizia que não sairia vivo daquela tarefa que impôs a si mesmo.

Enquanto se afastava daquela casa – que com certeza era uma de milhares, destruídas por uma das Alianças – ela pedia mais informações. Seus passos eram decididos e firmeza sobre eles continham. Sua cabeça ainda estava enevoada. Cheia de problemas. Ainda assim era uma nova mulher e queria saber tudo para começar a agir.
-Mallmor abandonou o Pacto de Guerra. Antes, no entanto, entregou um artefato de poder equivalente ao do Desalmado e do Cavaleiro da Pele de Platina. É chamada como Rosa Negra, pelo que eu soube. O Príncipe Negro dos Anões foi para próximo de Jerusalém, junto com uma comitiva de seus mais fiéis homens. Já o resto do exercito do dragão partiu na direção do tal lugar onde originalmente o Portal Infernal foi aberto. Ninguém, a não ser Sinestro sabe sua verdadeira localização. E eu não conseguiria retirar muitas informações das tropas. Quase toda sua formação, agora é composta por mortos famintos e revenants. Aqueles que não são assim, quase sempre fazem parte de grupos perigosos. Como ogros cheios de raiva ou necromantes perigosos. Ao que tudo indica também, o poderoso Matadouro morreu em combate.
Nesse instante, Halphy parou o discurso do amigo e o segurou pelo braço. Aquele monstro era extremamente perigoso. Os duendes verdes e ogros idolatravam-no como a um rei. Mesmo seus poucos dons arcanos seriam o bastante para triturar um oponente em alguns instantes.
-Quem o fez?
-Foi ao norte. Nas terras gélidas. Ele morreu para os Dragões da Justiça.
Halphy o soltou imediatamente. Sorriu como uma criança. E em seguida correu. Mais rápido que um lobo em disparada. Ou que uma águia sobrevoando os céus. Até mesmo mais veloz que um peixe em águas límpidas. Nikolai tentou a seguir com grande confusão em sua mente.
Parecia ter revivido na jovem algo que não fazia a mínima idéia do que se tratava. Ainda assim, ele acreditou ser algo deveras bom.
-Para onde vai? – gritava já sem fôlego, sendo que pouco ele havia corrido na verdade. Estava desacostumado com aquilo. Ainda que o tenha feito no castelo.
-Não usei o poder de minha bola de cristal, mas meu instinto me diz que se não estiverem... Ao menos devem estar indo na direção de Avalon. E é praticamente impossível comunicação através de magia lá. Além disso, é o único ponto de referência que tenho para saber onde eles estão. Mesmo que não seja lá que os encontre. Vamos seu ocioso. Deixe a preguiça e moleza de lado e me acompanhe. Necessito de seus dons ainda. Se quiser me ajudar.
-Quem esta em Avalon? E essa terra não é uma lenda? Nunca soube de um homem que esteve lá.
Com o inverno acabado e a vontade de Halphy finalmente revitalizada, aquele lugar parecia mágico agora. Subiu em algumas pedras e notou que havia montanhas mais a frente em seu caminho. Uma jornada dura que iria conseguir superar. Tinha que apressar o passo de qualquer forma possível. Talvez, ela mesma fosse chave para algo muito maior em toda a Gaya.
-Avalon é real. Meus pés tocaram aquela grama e aquele chão mágicos. Pretendo me reencontrar com os Dragões da Justiça. Eu acredito... Eu sei que eles podem impedir Sinestro. Assim eu espero.

Aqueles seres estavam em cima um lugar, onde deveria ser uma montanha no mínimo. Ao menos parecia ser. Algo dentro deles dizia que o lugar não ficava em um mundo comum. Devia-se ao fato que o céu estava repleto dos mais magníficos dragões dourados. Sem um sol sequer, mas parecia de dia. E o céu tinha dons em dourado poderoso, quase vivo que forçavam a vista daqueles estranhos no lugar. Tanto que não conseguiam definir como estavam vestidos os seus estranhos companheiros. Pelo menos eles eram assim uns aos outros.
Eram cerca de cinco figuras em volta de um obelisco. Nele, havia um símbolo, claramente ligado a um dragão dourado. Pareciam confusos, pois foram convocados por algo ou alguém. Havia entre eles – ao que tudo indicava – dois homens, uma mulher, um anão e um ogro. Cada um armado e equipado. Muito bem por sinal, apesar de não conseguir ver os detalhes.
Antes que pudessem fazer qualquer coisa – boa ou má – uma voz se fez ouvir.
-Ouçam! A terra em pisais é chamada Império dos Dragões do Sol. Fui eu que a criei. E sou pleno com meus poderes sobre tal localidade. Desafiem-me e saberão muito mais sobre isso. Da forma mais terrível possível. Conjurei-os até aqui por um motivo. Um crime bárbaro ocorreu em meu plano natal. Algo bárbaro, que não tem precedentes nos mundos conhecidos. Se pudesse interferiria nesse assunto quando soube dele. Não o posso. Por causa das leis que regem este universo. E isso me impede de punir a culpada por crime tão grave. Porém, conheço brechas dentro das matrizes nos mundos. Inclusive de Gaya. Seres mortais têm como cumprir o que não posso por fatores maiores. Onde vós podereis cumprir minha vontade e a justiça mais que divina. Pois ela foi cúmplice de um assassinato. Tal facínora que cometeu esse ato perverso e pérfido eu lidarei pessoalmente, ao meu modo. Entretanto quero que eliminem qualquer vestígio da existência repugnante da amaldiçoada mulher. Ainda assim, não tenho como os projetar em meu mundo de nascença. Isso ocorre já que um poder antigo, tratado como Paradoxo impede muitas coisas de ocorrerem por lá. Inclusive vossa incursão, sendo de lugares tão distantes, como sois vós. Compreendam e espereis. Já que um dia voltarei a convocá-los para eliminar Halphy Brown. A última mortal que viu meu irmão vivo. Não há com o que se preocupar. Ela partirá para a Cidade dos Portais em breve. Tenho certeza disso. Seja nos Impérios Esquecidos, Dragaurus, Terras do Falcão das Cinzas, Ofício de Guerra e Nevoa Sangrenta... Eu procurei os melhores aventureiros que pude. Serão recompensados como quiserem. E com quanto quiserem.
Somente a mulher questionou aquilo tudo. Quando o fez se adiantou na frente do obelisco.
-Mas quem é você para fazer tudo isso? No mínimo um semideus ou algo dessa estirpe. Só que nunca antes havia sido convocada por tal poder. Perdoe-me se pareço tola quando a isso.
Surgiu vindo do nada, um par de olhos dourados como o sol naquele céu. Uma cabeça surgia na forma de nuvens grossas e trovejantes ao redor daquele par de globos com a cor do ouro. Tinha a forma de um imenso crânio de dragão. Sua boca alargada, seus dentes protuberantes e até os chifres cheios de poder. Nada era comum naquele ser. E com certeza não se tratava de um mero semideus.
-Sou Ixxanon, deus dos dragões dourados e de todos os aspectos que punem os caóticos e maus. Meu poder é supremo. Não preciso pedir perdão a nenhum ser, visto que meus dons superam qualquer erro cometido quando poderia ser morto. Por tanto este dom também lhes concedo. Nunca precisais pedir desculpas pelo que farão, pois será em meu nome. E que vocês lembrem-se que os convocarei mais uma vez. E quando o fizer... Caçarão para mim.
Então, literalmente com um mero sopro, aquela forma tão magnífica fez com que os aventureiros sumissem tão rapidamente, quando apareceram. Em seguida cinco estrelas partiam para direções extremamente opostas. Era claro que se tratavam dos ainda misteriosos caçadores a mando de Ixxanon. Cada qual deveria ter retornado a sua terra de origem. Já que todos nasceram em mundos completamente diferentes, essa diversidade poderia auxiliar os jovens nos intentos que o dragão pediu a eles.
A forma dracônica se dissipou bem lentamente, como se fosse um manto caindo ao chão de uma casa. Quase de forma triste. Não sem antes deixar algo cair rapidamente. Parecia que era uma lágrima. Mas se alguém visse aquilo, pensaria se tratar de uma estrela cadente.




[1] Lorde

sexta-feira, 2 de outubro de 2015

(Parte 42) Hino da fé


Dois dias se passaram desde que houve – pelo menos é assim que os aldeões denominaram – o Martírio das Três Feras. Enfim, na manhã do terceiro, o navio com os guerreiros daquele lugar chegou à costa. Estavam tentando fazer acordos com outras vilas. Foi o que alguns deles falavam aos Dragões e ao Homem Santo.
Estavam inconformados com o estado da vila. Devastada. E caso não houvesse heróis ali, em pior estado estaria eliminada. Os deuses são um tanto caprichosos. Quando acreditamos que nada de ruim nos acontecerá é quando devemos redobrar a atenção. Podem nos tirar amor, fortuna, família, riquezas ou bem materiais. Ainda assim a fé permanece. E não é necessário que seja depositado tal atributo nas divindades. Basta que ela exista nos corações.
James os reconfortou com isso e muito mais. Apesar de acreditar em uma divindade, nunca sequer citada no panteão deles, o antigo Imortal Esquecido obteve atenção de todos. Propagar a palavra de Kanglor, no entanto, nunca foi sua função ali. Iria os ajudar e auxiliar no que pudesse. Pois essa era uma função dele como paladino.
Os Dragões da Justiça colaboraram também. Com os auxílios arcanos e físicos, em dois dias a pequena vila estava bem. Brincavam muito até, verdade seja dita, mas estavam bem entusiasmados com aquilo tudo.
Enquanto isso, Siegfried se apresentou ao líder daquela vila, pai de Hilde. Nos dois dias que seguiram – visto que o jovem falou com aquele homem, no mesmo dia que ele chegou – conseguiu passear com sua amada. Havia recebido a permissão do progenitor para sair com a garota.
Nunca se viu um casal tão feliz. Pareciam que haviam conhecido um ao outro, séculos atrás. Nem Lacktum queria admitir. Sentia inveja, só que James compreendia esse sentimento. Perder alguém nunca é fácil. Não importa a idade que se tenha quando isso ocorre.
Assim que os dois dias passavam os heróis se preparam para partir. Cada um ao seu modo.
O elfo se encheu de flechas. Até mesmo na mochila. Parecia uma aljava ambulante. Graças ao mago, ele obteve bom senso. Um pouco, bem pouco.
Thror treinou a exaustão. Queria usar suas novas lâminas de forma perfeita. Poderia treinar e conseguir manipular Trovoada e Relampejar ao ponto de fazer uma delas seu escudo em combate. Difícil aquilo seria. Já em sua cabeça estava mais que pronto como sempre.
Gustavo se isolou. Nem Arctus pode entrar em contato com o cavaleiro. Parecia que aquele homem quis se fechar. Algo incomodava seu ser. E o clérigo temia que estivesse próximo o dia que ele tombaria. Pois é destino de um homem igual a ele morrer contra o mal.
Ulfgar perdia os dias discutindo com Tom. Sempre eram coisas como brigas sobre martelo e raio mestre, filho e pai, Asgard e Olimpo. Ao menos o clérigo gostou do termo Valhalla. Claro que queriam falar de seus deuses patronos, e saber quais deles era o mais forte. Nunca alguém imaginou que duas pessoas contrastantes seriam tão parecidas.
E então, o dia chegou. Os Dragões e James teriam que partir em direção de Avalon. Houve uma grande série de despedidas tristes. Algumas até meio fúnebres.
O primeiro foi James com Deenar.
-Não posso partir contigo mestre? – perguntou de modo tristonho o anão.
James se agachou. Era até belo aquela cena: como se o humano referencia-se o pequeno elemental da terra. Ao fazer isso, ele segurou firme no ombro daquele que até então, era seu discípulo.
-Precisa ficar aqui. Um novo Homem Santo deve surgir. No meu lugar. Esse povo necessita acreditar em algo ou alguém. O clero cristão esta vindo. Tentando converter os homens. Alterando nossos modos antigos. E com isso, todos os deuses sumirão. Só que enquanto houver lendas, uma parte de nós ficará. Assim deve ser para sempre. Alguém que respeite as tradições. Este será você.
-Compreendo meu mestre. Sua voz me lembra uma despedida. Antes de um enterro ou cremação. Qual o motivo disso?
Eis que o mestre abraça seu pupilo, rapidamente. Como se o quisesse calar. Ainda assim, em um gesto quase fraternal.
-Você não é mais meu discípulo. Agora isso é um adeus em definitivo meu amigo. Espero que seja feliz Deenar.
Nesse meio tempo, Tom tinha problemas muito maiores com uma mulher. Valquíria o queria acompanhar. Não do modo que ele queria, contudo.

Havia discussões entres os dois já que ele nunca imaginou o que jovem realmente queria. Erro grande.
-Você quer ser clériga? De Zeus? – perguntava o jovem aos gritos e com tom inconformado.
-E qual o problema nisso? Falou-me tanto dessa divindade... Eu quero servir a ele por isso. Não posso?
-Pode! Lógico... Só que achei que iria querer outro deus. Ou melhor, deusa. Como Athena, Demeter e até Hera... Quem sabe a deusa da sorte... Por algum motivo não consigo me lembrar o nome desta.
Valquíria notou o jovem divagando. Tratou de cortá-lo desse transe. Estalou os dedos na frente de sua face.
-Não quero saber disso. Por ser mulher devo venerar uma? Sem sentido. Além do que, você só me falou de Zeus. Nenhum outro. Então a não ser que sua virilidade fale tão alto que não permita treinar uma mulher nesses caminhos.
-Não fale assim dos deuses. Mas há sentido no que diz minha cara. Até que deve ser bom isso para mim. Uma clériga de Zeus me auxiliando. Assim poderei combater de forma melhor...
-Por favor, de novo isso de se perder em pensamentos? É novo demais para ficar assim meu caro.
-Certo! Você pode ser uma sacerdotisa. Só me faça um favor: troque imediatamente essas roupas.
-Nunca que irei usar as mesmas vestimentas citadas por você uma vez. Minha bota é grande mesmo, minha saia dividida para me facilitar correr e uso peles do modo que os do meu povo sempre faziam e ainda o fazem. Se não esta satisfeito com isso então eu volto para minha casa. Além do que, foi você que criou a maldita aposta. Caso a memória lhe esteja falhando também.
-Raios. Esta bem mulher. Entre no navio.
Ela se abaixou. Pegou as coisas que trouxe de sua humilde morada e foi até a embarcação. Antes beijou a face daquele que seria seu mentor de agora em diante. Alguns dos homens ao redor riram do fato.
-Praga Tom. Fraco mesmo, hein? Consegue eliminar um terrível ogro mago, ao qual unificou seres de diversas raças. Porém, não convence nem um mulher – afirmou Lacktum com um sorriso.
Sem ter como negar Tom só confirmou com a cabeça. Os Dragões tinham mais um membro em seu grupo agora. Valquíria das terras do norte. E com coragem superior a muitos ali.

Valente ficou preso em um compartimento da embarcação. Longe dos humanos, pois poderia assustar os humanos. Não era como Rec, ao qual lacktum escondia através da magia. Fazendo o que lhe foi pedido ele se sentia nervoso.
Ao menos ele estava sem nenhum rato ao seu redor. E estava junto da comida. O problema continuava no fato de estar em um lugar extremamente apertado.
Nada poderia fazer por enquanto.
-Espero que eu possa fazer algo logo. Estou farto de ficar no pano de fundo.
Quem imaginaria Valente como peça chave de um dos principais confrontos que estariam por vir.

Quase todos haviam se despedido dos habitantes da vila naquele dia. Acolhedores e fortes sempre. O povo da região possuía muita garra em seu modo de vida simples. Com tudo isso eles já passaram por muitas coisas. Algo que nem os Dragões imaginariam. E estava enraizado em suas almas.
Estavam todos concedendo adeus as pessoas. E isso dificultava ainda mais a vida de Siegfried. Não foi dito muita coisa pelo que os bardos contam. Uma conversa simples, entre amantes.
-Quando irá voltar meu amado?
-Eu não sei. Juro, entretanto, que de alguma forma retornarei para você. Prometo-lhe.
-Não jure algo que não irá cumprir. O faça simplesmente.
-Eu o farei. Acredite Hilde. De alguma forma farei isso nem que para isso volte de uma forma nunca antes vista.
-Sabe que eu creio cegamente em você. Que o esperarei.
-E por isso, eu lhe peço... Caso o peso dessa espera seja demais para sua tão pura alma... Permito-lhe que encontre alguém digno. Com o qual terá uma família feliz como eu desejo a você. Pois a empreitada para salvar meu pai, não sei quando terminará.
-Não importa o quanto eu espere. É você que vou sempre esperar.
-Esta certa disso?
-Lógico!
-Minha Hilde. Amo-te tanto quanto existem estrelas no céu noturno. Na noite mais decorada com essas luzes.
-E eu a vocês, tanto quanto grão de areia na praia. Da mais longínqua terra e do mais extenso território.
-Tão pouco? – soltou Siegfried de modo irônico.
-Seu parvo.
-Eu sou. Por você eu sempre serei.
-É sim. O meu tolo.
-Agora irei partir.
As mãos dos amantes se desvencilharam. Pouco a pouco. Tão lentamente conseguiam ou poderiam fazer aquilo. Quase na velocidade de uma batida de coração. Quando os brancos de seus olhos não mais se cruzavam aqueles dois puderam agir de modo adequado na atual situação. Ele caminhou na direção do navio, de forma firme e decidida. Já a jovem correu para longe, o mais rápido que pode. Um casal que tentaria manter a chama do amor em ambos, mesmo com a distância.
Ao se encontrar com os Dragões, Lacktum perguntou se ele tinha certeza de sua atual decisão.
-Sim. Além de cuidar desses dois pesos – apontando na direção do anão e do elfo – necessito encontrar uma cura para meu pai. Compreende meu amigo?
-Cuidar do elfo? Pois sim! Não necessito disso – disse Bahamunt.
-Cuidar do elfo sim, pois EU não necessito disso! – gritou o ranzinza anão.
-Não necessitam disso para mim. Sei me cuidar muito bem, diga-se de passagem.
Enquanto falava isso, o elfo esfregava um anel em sua mão.
-Por qual motivo faz tanto isso? – perguntou Ulfgar na doca.
-Ora para encontrar minha mãe é claro – respondeu o elfo a sua frente.
Alguns homens o olharam com estranheza. Ulfgar os acalmou dizendo que eram coisas de elfos. Muito ali já tiveram convívio com os sidhes de Midgard. Por isso não estranhavam tanto o arqueiro ali. Seus hábitos, porém nunca passavam despercebidos...
-Eu lhes disse que talvez, se continuarem conosco, as pessoas ao seu redor... Não lembrem mais nada sobre vocês. Eu ainda não sei como isso funciona completamente. Mas é um efeito poderoso do que os mais antigos tratam como Paradoxo.
Siegfried abaixa a cabeça. Em seguida diz:
-Não terá sido tempo perdido. Além disso, eu sinto, dentro de mim, que uma pequena fração do meu ser esta aqui. Nessas terras, de onde nunca nasci. E que sempre vivi.
Ao falar aquilo, Siegfried subiu enfim na embarcação. E Lacktum questionou aquele fato. Caso estivesse naquela situação, o mago faria a mesma coisa?

Enfim, o navio concedido para a viagem deixou aquelas terras gélidas e ao mesmo tempo, tão calorosas. As forças e ânimos se inflaram com toda aquela situação. Alguns, pelo fato de conhecerem uma terra totalmente desconhecida e mística. Outros, por voltarem em uma ilha tão sombria, mas magnífica e bela. Pois assim também era a Arte. Ao mesmo tempo bonita e mirabolante. Intrínseca como uma chama escondida. Gentil como um ser celeste. Tolos são aqueles que acreditam plenamente nesse poder. Pior ainda aqueles que não o fazem.
Enquanto o navio passava em certo ponto, de um penhasco era visível uma figura. Feminina com certeza. Era uma última despedida. Tanto da amiga, que arriscaria a vida em aventura quanto dos heróis que partiam. Acima de tudo, do homem amado.

Passaram-se os dias lentamente. A embarcação cruzava no mar com velocidade única. O skeid[1] reformado pelos aldeões da vila e reforçado com feitiços tornavam-no quase um peixe na água. Suas almas agora se enchiam no peito com a vontade de encontrar mais respostas.
Para tanto, quando podiam os jovens treinavam. Pois sabiam que as respostas não viriam sem conflitos. Verbais ou físicos.
Thror usava suas lâminas junto de Gustavo, agora mais extrovertido. Tom guiava Valquíria nos caminhos e segredos de Zeus como podia. Bahamunt usava suas flechas contra a impetuosa defesa de Ulfgar de modo único. Estavam prontos. E agora estavam mais instruídos por Lacktum o quanto conseguia. Ainda que ficassem cansados fisicamente.
Em uma manhã, o paladino James chegou próximo do jovem mago. Ele estava do lado esquerdo, na frente do navio, onde ficava a cabeça de dragão esculpida. Parecia contemplar um futuro misterioso.
-Ouvi que você era meio fraco para viagens marítimas – comentou o membro dos Imortais Esquecidos.
-Criei um pequeno truque para acabar com enjôo. Uma simples mágica.
-Ora! Você parece sábio. Conseguiu criar até uma magia. Parabéns jovem talento.
O jovem riu desconcertado.
-Que isso. Foi apenas um simples truque. Se fosse uma magia mais poderosa eu poderia falar algo. Gabar-me talvez.
-Do jeito que vai nem tenho certeza se precisará do meu treino. É um prodígio meu caro.
Com isso dito o mago duvidou das palavras daquele homem.
-Desculpe. Como pode um homem de arma ensinar um mago? Não quero duvidar do senhor.
James sorriu e se apoiou na cabeça do dragão no barco. Então questionou o mago:
-O que é a magia Lacktum?
Lacktum convencido, quase debochou daquilo.
-É o meio pelo qual alteramos a realidade ao nosso favor. Todo mago e feiticeiro sabe disso.
-Parabéns! Mas o que disse são fezes, próximo do que realmente ela é. Entenda que ela é bem mais que isso. Ela provém dos nossos sentimentos. Não importa se eu sou bom ou mau, a magia esta em nós. Em tudo ao seu, e ao meu, redor. No arquimago poderoso, no guerreiro audaz ou no aldeão trabalhador. A arma de um homem que combate não é uma espada, machado ou lança. É o conhecimento que obteve para manejar aquele item. Assim como você lida com a Arte deve saber que isso também é feito através do seu coração. E ai você extrai o mana para seus feitiços e encantos. Isso difere as focas arcanas da famosa Lei. Até um morto sem descanso tem esse poder, como pode ver por Kalic Benton II.
O jovem mago sabia que mesmo sendo um abridor, aquelas palavras faziam sentido. E ao perguntar ao paladino como obteve tal conhecimento, ele obteve uma resposta bem simples: eu vivi.

Em outro lugar, em uma espécie de santuário arcano, dois encapuzados caminhavam até um circulo mágico. Os dois conversavam seriamente. O primeiro usava um capuz muito maior.
-Mestre, você acredita que estou pronto? Crê que eu posso estar apto para trilhar esse caminho?
O segundo notou aquela pergunta com um tom de fraqueza. A falta de confiança naquelas palavras. Isso era comum, visto o tamanho de sua missão. Não poderiam deixar que aquilo enfraquecesse suas determinações.
-Não tema. Wolfgard seu nome estará em lendas. Recitaram poemas e histórias. Lendas e feitos surgiram sobre sua graça. Estamos partindo para Avalon onde poderão alcançar uma grande proeza. Lá, o destino lhe possibilitará encontra e finalmente libertar o seu pai.
A dupla alcançou o lugar com alta magia, o ponto mais forte dali. O segundo homem mexia suas mãos decrépitas lentamente. Fazia círculos no ar, além de criar movimentos únicos e circulares. Estava clara sua concentração em cada elemento daquele rito. Quando isso ocorreu àqueles gestos ficaram rápidos, quase frenéticos. Enfim, brilhos arcanos e forças realmente poderosas preenchiam o lugar rompendo o tempo e o espaço. Depois de que cada uma das marcas obteve sua posição, os dois sumiram com a vontade daquele mago.
Um detalhe que vale mencionar é que o primeiro homem era filho de um dragão. E um Dragão da Justiça ele estava destinado a ser.

Em determinado momento daquela viagem, enquanto Tom tentava ensinar certos costumes dos gregos para Valquíria e o resto do grupo mexia nos remos, Valente começou a cantar. Era a mesma canção cantada por Thror tantas vezes. E o guerreiro careca com cicatriz acompanhava o suricate com sua voz. Até que bonita. Ainda assim já era repetida muitas e muitas vezes no mar.
-Parem de cantar a mesma coisa sempre praga – exigiu Ulfgar irritado. Anões gostam de canções, mas nunca de repetições.
-Então querem que eu cante o que? – perguntou Thror enquanto remava. Ele estava até que bem distraído.
-Eu não sei. Só mudem de música! Oras!
Sem que pudessem pedir algo, os membros dos Dragões da Justiça ouviram uma voz até que graciosa. Meio tremula e fraca. Era James Gawain na borda do navio cantando. Uma perna estava na parte lateral da embarcação e a outra na parte superior.
Terra de urso, terra de águia
Que nos deu o berço e a benção
Os jovens pararam seus afazeres para ouvir aquilo. Não parecia ser forte a canção. Porém, o coração dentro do paladino tinha certeza do motivo de cantar. Muitas pessoas pensam que uma música só deve ser proferida por um bardo. Só que em seu coração se houver uma chama antiga que o faz querer cantar – seja perda, amor, ódio, raiva, lamentação, inveja, serenidade, bondade, caridade, confiança, orgulho, luxuria, temperança ou até crença – deve o fazer com as letras que encontrar.
Bahamunt interrompeu falando que aquilo era comum das mulheres cantarem.
Nova surpresa, pois Lacktum o seguiu, de pé, cantando:
Terra de urso, terra de águia
Que nos deu o berço e a benção
Terra que nos dá esperança
Vamos voltar por entre os montes
Então, mesmo aqueles que não sabiam cantar aquele som tentavam repetir seu refrão. Criando um som único por todo aquele mar. Até mesmo a pequena criatura animal que sempre os acompanhava.
Vamos voltar, vamos voltar
Vamos voltar por entre os montes
Enquanto faziam isso, ninguém notava que na mão de Lacktum, além de seu grimório havia outra coisa. Um tomo. O mesmo que foi entregue por Azerov. O livro da loucura de Lacktum

As águas não eram mais do mar. Pareciam mais com as de um lago ou rio caudaloso provavelmente. Além disso, brumas surgiam. Não era como uma simples neblina matutina. Havia algo ali que era vibrante, atraente, belo e único. Muito raro. Quase mítico. Ninguém ali sabia descrever perfeitamente o que era aquilo, mas alguns sabiam o que significava. Haviam enfim, chegado às fronteiras de Avalon.
James e os membros mais antigos do grupo pareciam caçar algo com seus olhos. Era uma pessoa. Qualquer figura que os auxiliasse chegar até a real Ilha das Brumas.
Tom, Ulfgar, Bahamunt, Siegfried e Valquíria estranhavam aquela reação tão sem sentido dos colegas. Achavam até que estivessem mais loucos que o elfo. Esse não se ofendeu naquele momento.
Foi Thror que apontou em uma direção dizendo com muito orgulho sobre sua descoberta:
-Ali! Mestre James! Nas pedras! Há um elfo! Como quando chegamos à primeira vez em Avalon. Não é o mesmo, mas sei que se trata de um.
O mesmo que deve a atenção chamada mirou na direção apontada. Ele colocou a mão no ombro do guerreiro grego.
-É isso mesmo amigo. Muito bem.
Era notável que o sidhe usava vestimentas arcanas de tom azul berrante. Cabelos longos presos em formas trançadas o faziam ter um mais nobre ainda. O que parecia estranho para um lugar tão isolado na água. Seus olhos demonstravam um poder tremendo e cheio de segredos que alcançavam facilmente almas tolas que o fitassem. E ele pairava em cima das pedras. Não havia dúvidas que descenda no mínimo, de uma casa nobre dos elfos.
-Ora essa. Eu entro nas terras dos elfos. Para qual motivo? Ver mais deles malucos como esse aqui – e ao falar isso, Ulfgar apontou para Bahamunt. De um modo irônico.
-Não faz sentido! – soltou Tom – Até chegarmos aqui nada havia. Olhei na mesma direção do guerreiro. Em um fechar e abrir de olhos, após ele falar isso, ai estava o sidhe. Nessa pedra. Em um lago! Como?
Ao ouvir isso, Lacktum logo tirou a duvida do clérigo.
-Aquele é como poderíamos chamar... De um porteiro. É ele quem protege as fronteiras entre as terras de Avalon e a nossa. Assim como ocorre em outros reinos élfico, eu presumo. Seus poderes são demasiados grandes. Podemos comparar seus dons ao infinito dos céus, ou a extensão das águas no mar. Nem sei se isso seria suficiente, acredito.




[1] Outro nome para os drakkar, navios de guerra viking. Chegava a 22 km/h (12 nós)

sábado, 19 de setembro de 2015

(Parte 41) Ruínas assombradas



Ela despertou em um lugar que conhecia bem. Cheio de sombras e crueldade. Onde antes havia um espelho, sabia bem. Agora surgiam olhares de desaprovação e maldade. Um inimaginável ninho de cobras perigosas. Se estivesse bem, e não sendo tratada como uma traidora chamaria o lugar como lar. Mas aquele era o castelo de Sinestro.
Halphy estava cercada por boa parte dos membros do Pacto de Guerra. Ainda assim, faltavam Daehim, Matadouro e Mallmor. Nikolai, desacordado e ferido também estava ali.
Queria que tudo fosse um simples sonho. Contudo, era realidade e nada mais seria como antes.
Estava sem nenhuma de suas armas. Nem as facas, nem a bestas, muito menos Vampira de Almas. Só lhe restava suas roupas rasgadas. Além de suas algemas, pesadas e com símbolos arcanos. Era óbvio que elas tinham grande poder. Notou que Nikolai também possuía um par ao redor de seus pulsos. Nenhum deles poderia usar magia.
Em um trono de pedra estava sentado Sinestro, coberto por manto só deixando só os olhos reptilianos a mostra. Uma espada estava acima das pernas do ser. Era Fim- dos- Dragões. A pouca expressão visível trazia certa raiva. Constatava-se que ele já soube da tentativa daquela jovem em tentar abandonar o Pacto de Guerra. Era claro como a luz esse fato.
-Sinto por suas atitudes Halphy... – começou o dragão que ainda estava sem sua forma original. Não deveria ter se passado muito tempo desde que ficou desacordada pensou a jovem assassina. Ela o interrompeu de forma pesada.
-Poupe-me Sinestro! Tem outros planos. Para mim e todo o seu maldito Pacto não é?
O líder daquele grupo se levantou com demasiada raiva.
-Como ousa levantar a voz para mim! Não passa de um animal! Um ser domesticado.
-Ouso isso e muito mais! Maldito é aquele que confiou em Coração Gélido. E mais ainda, quem o fará. Chamou-me de domesticada? Até um cão pode morder seu dono quando for maltratado!
Nesse momento, as garras dele levantaram o corpo de Halphy. Em questão de instantes, ele saiu do trono. Igual a uma assombração alguns diriam. Não que estivesse muito longe disso. Erguia a jovem pelo pescoço.
-Cale esse buraco cheio de fezes que acredite ser uma boca – disse ele enquanto a asfixiava. Em seguida, lembrando que ela ainda teria um propósito, lançou ela para longe.
Nenhuma reação vinha dos espectadores. Só os artistas daquela peça profana.
-Sorte sua ainda termos você como uma peça chave. Nossos planos necessitam de você.
Nikolai despertou com o golpe que jogou a jovem para longe. Ele a viu usando a parede para se apoiar. Lentamente se levantou. Seu corpo parecia moído, ainda assim tentava manter-se firme diante de tudo. Cada vez mais difícil. Ainda assim, ela ria.
Sua risada veio de forma irônica. Meio triste, ainda assim queria ferir seu antigo mentor. Já foi dito que as palavras trazem dor. E algumas outras coisas surgiram na sua cabeça com um sorriso enlouquecido.
-Não sei o que é pior: saber que fui usada ou me lembrar quem fez isso. Queria alcançar o poder, só que agora noto com tristeza, ele não estava em você. Pois caso o tivesse não teria ardis necessitando de humanos como capangas – e ao falar isso ela cuspiu no chão.
Ele ficou de costas tentando se controlar. Em seguida exigiu que as duas criaturas fossem retiradas de sua presença.
-Eu vou lhe mostrar quem é inferior! – gritou Halphy enquanto era levada por uma dupla de revenants. Essas criaturas ficavam nas sombras, imperceptíveis. Com a forma de uma armadura ninguém imaginaria que eram monstros.
-Halphy o que houve? – pediu o alquimista. Ele também era levado.
-Estamos sendo preso para mais tarde auxiliar os planos de Sinestro.
Enquanto eram arrastados, o dragão sentiu que algo estava errado. Não era para isso ocorrer. Pois o que ele queria estava perto de si e de vários outros.

Foram presos os dois. Em uma das celas do castelo. Uma das que passou poucas vezes quando participava do Pacto de Guerra. Por qual motivo pensaria naquele lugar questionou muitas vezes.
-Por todas as forças do oculto! – Nikolai falava isso enquanto batia sua algema contra a grade – Quem concedeu essas algemas para os servos de Sinestro? Eles não teriam capacidade para isso.
Halphy encostada na parede ficou pensativa. Lembrou-se da morte de Jean. Da mão de Raquel o atravessando com um golpe arcano. Era sua culpa isso acontecer com ele. Tão grande era sua sina. Será que alguém teria piedade dela, depois de suas atitudes covardes? Nunca ela pensou.
-Ei! Donzela? Poderia me ajudar a reclamar aqui?
A moça parecia ter saído de um transe. Lembrou onde estava quando notou Nikolai na sua frente, pedindo atenção.
-Desculpe... Estava em outro lugar.
Ele se agachou e se aproximou da moça. Parecia bem mais calmo, do que quando reclama de suas mãos presas.
-Não foi sua culpa minha cara.
-Do que esta falando Nikolai.
-Foi Raquel quem matou Jean. Não você.
Ela o olhou carinhosamente. Finalmente se levantou. Tentou arrumar a si como podia.
-Obrigado Laskov.
Foi até a direção da porta da cela onde estavam. Ficou de costas para ele.
-Eu sei que você sabe meus segredos – ele falou com tom sombrio.
A jovem virou seu pescoço na direção de Nikolai.
-Como sabe... Ah! Zacharias, não é?
O pobre alquimista afirmou com sua cabeça. Era constrangedor. Nunca pensou naquela situação a jovem.
-Eu não quis... Eu só... Perdoe-me – só agora notou o quão invasivo poderia ser aquele artefato.
-Você não pensou que o seu feito foi mais que uma carta? O que soube?
-Você trabalha para a Santa Sé.
-Parece pouco. Não parece algo que arrancaria de mim donzela.
Suspirou fundo a jovem antes de relatar:
-E da mulher que um dia amou.
-Ah!
Era a vez dele se sentar.
-Nunca pensei que voltaria a me lembrar de minha amada. Não desse modo. Se me recordo bem, eu era um alquimista em começo de treinamento. Só que tinha talento. Muito. E me apaixonei quase que por acaso. Eu pegava ervas para uma solução alquímica. Ela procurava algumas para um corte que sua mãe sofrerá. Não sei o motivo para isso acontecer àquela senhora. Algumas coisas ainda ficam nubladas em minha mente. O que é certeza... Éramos felizes. Sendo tolos ou não. Só que o destino é cheio de artimanhas. Ela era do legado de Andrômeda.
-Legado?
-Sim. Ao que tudo indica algumas mulheres que descendem de Andrômeda eram sacrificadas. Para um tipo de fera antiga. Deve saber da lenda.
-Andrômeda, oferecida a uma fera. Para aplacar o ódio de um deus. Não é isso? Nunca fui especializada com mitos gregos.
-Exato. Eu morava próximo a essa vila que mantinha os costumes. E cheguei tarde demais. Por isso sou assim. Cheio de vontades para tentar esquecer a dor.
-Compreendo.
A garota queria lhe conceder pêsames, ainda assim não o fez. Do que adiantaria? E de qualquer modo não havia necessidade para aquilo no momento. Nem tempo suficiente.
-Como podemos fugir – ela questionou.
-Eu estou pensando. Mas tem pelo menos dois revenants na passagem que nos concederia a liberdade.
-O problema nem é esse. Eu me refiro a essas coisas – apontando para as algemas.
-Deixe-me pensar...
-Vejo que estão em dificuldades – disse uma voz no canto da cela.
Os dois pularam de susto. Aquela cela pequena tinha outra pessoa? Impossível. Ainda mais sem nenhum item no local.
No lugar de onde ouviram aquela voz, uma forma estranha surgia. Começando por sua pele. Tinha escamas, como um marduk, só que essas eram mais brilhantes e coloridas. Além de lembrar mesmo, partes de uma serpente. Até os cabelos pareciam mais com uma cobra. Seus olhos totalmente e com um parentesco mais claro ainda com um ofídio. Garras de um poderoso dragão no lugar das mãos e pés – estes descalços. Possuía uma roupa que Halphy tinha certeza ser de pura seda muito cara. Nela, além de haver um estilo diferente de qualquer vestimenta que já viu seu contorno era recheado de desenhos. Estranho para a assassina e o alquimista.
-Quem é você? Ou melhor, o que é você? – perguntou Laskov.
-Parece um marduk.
Aquele ser cuspiu de lado. Estava enojado com a comparação.
-Perdoe-me, mas não me rebaixo a um nível de meio-dragão.
-Não vou tomar isso como pessoal, ainda. Então é o que? Ou melhor, veio de onde? – perguntou mais uma vez a jovem.
-Vim de uma terra muito longínqua. Na desconhecida, por vocês, Yamato[1]. Só que essas terras possuíram outros nomes. Até pelos homens do continente. É como uma ilha para vocês. Águas poderosas por todos os lados. Pelo que eu vi, ela não esta nos mapas de vocês das terras do Oeste.
-Não existem terras assim – soltou Halphy.
-Conhece pouco do mundo com seus olhos jovens, Brown.
-Sei...
-Também aquelas terras são chamadas de Hinomoto[2].
-Eu não quero saber disso! Por qual motivo esta aqui?
-Vocês são apressados. Meu mestre chama-se Yo-Long. Ele é o que vocês chamariam de um dragão. Para mim é como um deus. Pois foi ele que me ensinou a obter essa forma. Devo tudo a ele. Ele disse que você pode auxiliá-lo. E que lhe concederia o que quisesse. Se o libertasse.
Ela riu.
-Tem muita gente que quer muito de mim.
-Pode até ser. Mas ao menos não pode ficar do que já esta Brown.
Ao falar isso, em um piscar da dupla presa, o estranho homem saiu daquela cela. Ele se virou para os jovens antes de partir.
-Sou Long, um pupilo do dragão. Adeus Brown.
Eis que o homem caminhava para longe das grades. Uma nova alternativa surgiu para a jovem. O que não era muito bom de qualquer forma. Eis que uma idéia lhe veio à cabeça.
-O Portal da Verdade.

Estava uma vez mais no lugar que foi mandado após encontrar a Chama Gélida. Dessa vez estava tudo branco. Mas o imenso portão continuava onipotente e flutuante. Igual as forças mais antigas, perigosas e poderosas do universo. Era como se um medo enorme lhe surgisse na mente, só de encarar a construção. O motivo lhe era um mistério, mesmo já sabendo seu conteúdo. Que os mais loucos deuses parariam e se perderiam contemplando aquilo. Não era momento para aquilo.
-Kalic Benton! Onde esta?
Momentos depois, como por encanto, o mago mascarado apareceu. Ele a encarou.
-Você sabe que esta encrencada? Em um nível que nunca poderei lhe auxiliar, se é isso que pensou.
-Não me diga! Qual foi a primeira pista? Acho que o seu silêncio, enquanto Sinestro quase me enforcava já demonstrou bem isso.
-Interferir só seria um desperdício. Acha mesmo que eu o deteria? Qualquer um de nós não conseguiria nem sequer lhe causar dano. Mesmo naquela forma decrépita dele.
-Eu imagino mesmo.
O mago olhou impaciente para a moça. Sabia que ela queria algo dele mesmo assim. Ela sempre faz de tudo para se livrar.
-O que quer?
-Um método de fugir.
Ele riu. Nunca ouviu tamanha besteira. E Halphy nunca o ouviu rir tanto de algo ou alguém.
-Não há como.
-Mas você pode me ajudar.
-Disse bem. Eu posso. Tenho poder para tanto. Só que não o farei. Há uma grande diferença.
-Sinestro é um morto sem descanso. Não pode utilizar o dom da Lei em você. Mesmo que pudesse você nem seria afetado. Esse tipo de criatura, como vocês, é impossível ser afetada. Eu sei. Já tentei.
-Compreendo. De qualquer forma enfrentar Sinestro não se encaixa nos meus planos. De forma alguma.
-Você realmente é um homem difícil às vezes.
-Deuses! Você acha que seria fácil? – disse inconformado Kalic benton II.
-Não. Mas bem que poderia trazer uma solução.
-Entenda que não sou seu amigo. Nem tão pouco, seu aliado. E atualmente nunca serei mais nada seu devido as suas atitudes. Trair Sinestro é trair o Pacto de Guerra.
-Só me diga uma coisa: você crê em Sinestro?
Foi quando ele se calou, virou de costas e se afastou da assassina que parecia já desesperada.
-Adeus Halphy Brown.
-Espere! Tenho uma coisa a lhe falar.
Ele então parou sua caminhada.
-Eu eliminei sua mãe.
O mago colocou sua mão direita na máscara. Parecia refletir sobre algo.
-Você a queimou?
-Do que esta falando?
-Não ouviu? Perguntei se você a queimou.
-Acredito que não. Não. Não o fiz.
-Tudo bem. Então ela continua viva... Ou melhor, não esta morta. Adeus Halphy Brown.
Mesmo de costas aquele mago deveria imaginar qual era o rosto da assassina. Ela cortou sua cabeça, e a desgraçada ainda estava viva. O que lhe fez crer nisso foi à visão da destruição do Kalic Benton original. Realmente aquilo fazia sentido. Infelizmente.
Teria que voltar até Nikolai e se preparar. Samara ainda estava viva.

Despertou com Nikolai desenhando algo. Parecia ter uma cor vermelha, onde estava aquela forma. Então notou o ombro e o rosto do rapaz. Além, lógico, das suas mãos. Era vermelho sangue. Pois era sangue. O que ele fez, pensou ela. Foi quando uma idéia macabra lhe surgiu.
-Você se mordeu até sangrar? Enlouqueceu Nikolai!
Suas mãos formaram um círculo de transmutação. Grande e poderoso. Estava muito claro aquilo.
-Enquanto você caçava algo no plano astral[3], eu tentava outro modo de fuga minha donzela querida. E então? Obteve sucesso?
Balançou a cabeça em negativa. Um rosto de tristeza e frustração lhe veio rapidamente.
-Imaginei isso quando despertou minha pequena. Não se martirize. Convencer seria impossível. Eu acredito.
-O que pretende com isso – perguntou a aflita assassina – Esta sangrando muito e nem pode fazer magia!
Ele sorriu. Mesmo com a boca suja se sangue. Parecia sabre mais que ela. Ao menos estava feliz.
-Você aprendeu sobre a Arte e a Lei. Nunca sobre suas variantes. Nesse caso, a alquimia. Ela não é como magia. Dizem que um feiticeiro ou arcano de qualquer tipo age como um abridor. Por isso usam esse termo. O que realmente eles se parecem são chaves. Pois armazenam o mana em si. Seus corpos são um meio para os fins específicos. Já os que transmutam – alquimistas – não a armazenam. Usam a energia em tudo que existe para façanhas.
Em seguida tocou com ambas as mãos o símbolo. Nesse instante, as algemas se partiram ao meio com a força de um brilho arcano.
-Ainda bem que como você, mesmo os membros do Pacto que usam um pouco de alquimia, não entendem disso. Pois se soubessem me cegariam. Ou quebrariam minhas mãos. Talvez os dois... Bem, de qualquer forma logo estaremos livres, donzela.

Um grande barulho surgiu da cela. Poderiam tentar usar magia para fazer tudo de forma silenciosa e furtiva. Só que então se lembraram que seus vigias eram construtos. Imunes a ilusões.
Ainda assim magia era uma boa arma agora. Ela soltou uma faísca na direção do guardião. Isso o deixou extremamente lento. Ao menos uma vantagem contra estes seres.
Enquanto o outro, Nikolai atingiu com uma lança de pedra, ao qual usou parte da parede da prisão para criar. Atravessou a couraça atingindo o pentáculo. A armadura caiu e o jovem gritou de dor.
-Nikolai!
-Não foi nada. Usei o braço com meu ombro ferido. Vamos caçar nossos equipamentos. Adiante.
E os dois fizeram isso. O mais rápido que puderam, já que sabiam que logo seriam atacados.
Chegaram à câmara de espólios. Ali, naquele lugar, os servos de Sinestro depositavam seu butim. Ou seja, todo o ouro ou itens mágicos dos adversários caídos. Até de povoados indefesos.
Conseguiam enxergar onde estavam seus itens, inclusive Vampira de Almas e a besta. O alquimista pensou em legar parte do ouro – uma pequena fração – mas foi dissimulado pela jovem. Seria já muito perigoso sem o peso extra. Caso isso ocorresse o corpo ficaria lento como uma lesma. Realmente fazia sentido.
-Se for como diz... – falou um inconformado jovem.
Um detalhe é que ela encarou outra arma. Talvez seu maior símbolo de traição. Pois não feriu Daehim com ela, quando possuiu uma chance para tal. Tratava-se de um item que os Dragões obtiveram com justiça. Os mais antigos e sábios a chamavam de Silthar-Mor. Fim-de-Dragões.
Segurou-a com ambas as mãos observando bem seu brilho. E quantas lembranças ela conseguia trazer. Lembrou que foi um presente e de quando a pediu no Vale das Esmeraldas. Memórias de antes e depois dela. Por último, em como traiu os antigos colegas. Ela iria levar a espada, como oferta de paz.
-Será que me perdoariam? Eu...
-Donzela Halphy! Esta ouvindo? – disse o rapaz pedindo atenção. Um som de sino era claramente ouvido – Devem saber que estamos fugindo.
-Não é nada disso. O sino para fugas é outro. Fui instruída sobre isso por Kalic Benton. A construção esta sob ataque.

Eles corriam. O faziam por suas vidas. Para tal necessitavam cruzar a ponte. E mesmo estando longe do ataque ouviam vários sons. Alguns conhecidos, outros nem tanto. Grunhidos, barulhos de armaduras e poucos gritos que pareciam humanos. Jurariam até que ouviram o som de um urso.
E então uma idéia surgiu para Halphy: poderia ser que Brigid estivesse atacando a fortaleza de Sinestro. Ela com enxergaria aquele lugar. Em especial devido aos seus grandes poderes. Além disso, usando uma forma animal apropriada, era fácil rastrear qualquer um.
-Algo possível. Mas não é momento para nos preocuparmos com isso – soltou a moça, enquanto corriam. Precisavam sai vivos daquele lugar primeiro.
Passando por corredores iluminados só pelas chamas de tochas. E quando mais chegavam perto do lugar. Uma luz fraca surgia. Tratava-se da abertura para a ponte.
Enfim chegaram até o arco que concedia acesso ao lugar que queriam tanto chegar. O único problema é que havia sentinelas já ali. Alguns com espadas e outros com arcos.
-Revenants – disse Nikolai.
-São sei. Eu lido com eles.
-Donzela Halphy! – e antes que pudesse fazer ou falar qualquer coisa, ela partiu em investida. Não havia notado que tinha os ferimentos do ataque de Zacharias. Mesmo sendo entorpecida com as ervas raras, seu corpo não cicatrizou devido a um efeito colateral. Ainda que fisicamente continuasse forte, seu corpo tombaria diante alguns golpes. Ele só poderia ajudar naquele instante. O quanto pudesse e conseguisse.

Atacou um dos primeiros na frente. Não era uma combatente boa o suficiente para eliminar todos de uma só vez. Ao acabar com um pularia para o outro com Vampira ao seu lado.
Como uma boa ladina encontrou uma brecha na armadura. Conseguindo isso, com a lâmina rasgando o símbolo que mantinha aquele ser em pé. De certo modo foi até fácil. O problema eram os dois ao seu lado. Alguns ataques deles fizeram-na cambalear. Se Thror ainda estivesse com ela em combate. Poderia até ver a silhueta dele lidando com o outro oponente.
-Detesto admitir, mas eu sinto falta de uma retaguarda protegida – admitiu a si mesma.
-Não seja por isso donzela.
Eis que os inimigos são atingidos por energia bruta. Ainda assim, não de forma fatal. Pedaços de metal danificado caem das armaduras vivas. Um grande auxílio. Facilitando o ataque contras os símbolos de transmutação.
O que nenhum daqueles dois fugitivos notou foi que os revenants de trás levantaram finalmente seus arcos. Nunca haviam visto aquelas criaturas usando armas de longa distância. Cada um com três flechas preparadas. Foram então disparadas sem cerimônia.
Aqueles golpes não foram esperados. De modo algum. A primeira saraivada atingiu a área do estômago, o seio e o seu ombro do lado esquerdo. Isso a deixou atenta. Só que era tarde. A segunda leva atingiu o braço que segurava sua espada. Um grito pior que de um animal abatido surgia naquele lugar. E estranhamente, ele ecoava. O sangue escorria, jorrava. A quantidade do liquido escarlate era imensa. Tinha que se manter em pé. Trocou sua arma da mão hábil, assim usando-a como bengala. Abriu os olhos só para notar aquele que seria o último e fatídico golpe. Das três flechas, a única que atingiu foi mortal. No pescoço.
Seu corpo tremeu demais. Estática por enquanto e sem força, ela tombou finalmente. Ainda no chão se sentia leve. De repente estremeceu como um cão faminto. Gemeu como uma assombração. Era uma poça tão grande daquele líquido saindo do seu corpo que engolia facilmente sua saliva. O dia sumia em sua vista. E a vida também.
Nikolai chegou ao corpo desfalecido, daquela que sempre ele tratava por donzela.
-Halphy! Minha linda! Fala comigo! Vamos! Reage! Ofenda-me! Desistir agora não! Halphy! Não me abandone!
Enquanto ele falava, a jovem encarava aquele céu. Na verdade não sabia em que lugar sua visão deveria ver. Os sentidos sumiram e como dito, enxergava só a escuridão. Suas palavras, nem sentido faziam mais. Nada além de letras separadas e jogadas a esmo, sem conseguir obter uma forma. E tantas coisas, assim mesmo elas significavam. Em especial perdão. Pelo menos ao jovem Nikolai, ao qual nem imaginou causar tamanho mal. Seus atos canalhas ainda tinham motivos mais dignos em comparação e ela. Era um sujeito cheio de falhas, mas ainda assim, mais nobre.
Ela queria poder. Única, exclusivamente e simplesmente. Envergonhava-se disso agora. Pelo menos era sincera em sua mente. Nunca achou que aquilo era tão tolo.
Em seus instantes finais, lentamente se lembrou dos Dragões. E queria os contemplar uma última vez. Assim como Jean.
E Yo-Long a ouviu na sua própria mente. Atentamente.



[1] Antigo nome para o Japão.
[2] Outro nome para o Japão.
[3] Plano de

terça-feira, 8 de setembro de 2015

(Parte 40) O herói sem um nome


A lâmina do homem santo atravessou o peito de Lacktum. Ainda assim aquele anão continuava a segurar todos os Dragões da Justiça. Deveria ser louco como seu mestre. Ele queria seus companheiros – mais que isso, amigos – não fizessem nada enquanto aquele bêbado enlouquecido o matava diante de seus olhos. Era demais para Thror que devia sua vida e muito mais para aquele mago arrogante.
Enquanto isso, o Homem Santo falou:
-Você é só uma criança. Não sabe o que é dor. Esse golpe que sofreu não é nem metade da dor que senti em minha extensa vida. No dia em que sofrer tanto quanto eu... Então poderá dialogar comigo criança.
No momento em que esse homem iria retirar a espada, o mago segurou aquela lâmina com ambas às mãos. Havia levantado seus olhos com raiva e a boca expelindo sangue.
-Pensa que por ter perdido algo ou alguém sua dor é maior que a minha? – após falar isso soltou mais sangue ainda. Manteve-se firme assim mesmo – Sua imortalidade ou tempo nessa terra não o torna especial. Sua família deve ter morrido, como a minha que foi completamente destruída. Não importa como ou onde. O que significam para nós é o que importa. Só acha que sua dor vai se resolver isolando-se? Física e mentalmente sei que a resposta nunca será essa. Pois hoje... Eu tenho uma nova família.
Quando aquilo foi dito, era claro a felicidade nos rostos de Thror, Gustavo, Seton e Arctus. Até mesmo nos dos recentes novos aliados Ulfgar, Bahamunt, Siegfried e Tom. Valente quase chorou com aquelas palavras.
Ao notar aqueles rostos, o Homem Santo se espantou como as palavras do moribundo eram tão belas aos outros.
-Qual o seu nome abridor? Não sei se falou isso. Foram tantas tolices que proferiu...
-Lacktum... Van Kristen.
Em resposta a isso, finalmente tirou a espada, gritando:
-Por Kanglor, Senhor da Fúria, peço que esse tolo herói seja curado do mal que lhe causei! Eu lhe imploro Mestre da Ira!
Em seguida, o corte causado no peito de Lacktum simplesmente não existia mais. Nenhuma marca sequer.
Finalmente Deenar permitiu ais Dragões que se aproximassem do companheiro e líder. Thror o abraçava com força suficiente para partir um homem normal no meio. A maioria ria da situação, com exceção de Bahamunt, que nada entendeu.
Ainda assim, algo deixava Lacktum intrigado. Enquanto o Homem Santo se afastava ele fez uma pergunta:
-Por qual motivo me atacou? Não faz sentido.
Ele parou. Passou a mão pelo rosto como se estivesse limpando a barba.
-Queria ver se você era igual Kalidor. Pelos deuses, você não é. Pelos deuses, não é.
O Homem Santo saiu da caverna.
Deenar então disse que aquele era o modo dele falar sim ao pedido dos Dragões. Realmente, o homem deveria ter um grande ódio por Hein Hagen.

Passaram uma noite naquela caverna. Nela conversaram por um longo tempo. Primeiramente, os Dragões da Justiça falaram de sua união no Reino da França, devido a um mal que estava para ressurgir. Os amigos Ulfgar, Bahamunt e Siegfried também conversavam de modo engraçado, sobre a origem daquela estranha união. Deenar comentou que foi adotado e criado pelo Homem Santo. O que faz pela sua honra querer melhorar a vida do seu tutor. Por último, Tom falou que foi adotado e criado de modo a ser um clérigo de Zeus. Talvez o único que nada falava seu anfitrião ranzinza. Ele nem se aproximou da fogueira improvisado por aqueles homens.
Lacktum se levantou. Pegou um dos odres vazios e o encheu. Depois caminou até aquele homem oferecendo bebida. Foi aceito o gesto de gentileza.
-Ei! Lacktum, não desperdice bebida com esse chato! – soltou Thror.
-Não deveriam desperdiçar vinho é com você seu bêbado! – gritou Gustavo – Ele é nosso anfitrião.
-Ah! Cale a boca paladino medroso.
Quando o guerreiro grego disse aquilo parecia que houve uma reação do Homem Santo. Só que ninguém sabia se era um bom ou mau sinal.
-Tome – disse Lacktum ao homem.
-Eu não quero.
-Não é que seu hálito demonstra – ao disser isso o mago sentou-se ao seu lado oferecendo aquele odre ainda – Vamos. Deve-me uma. Devido aquela espada no peito lembra?
-Eu sinceramente não compreendo os jovens dessa época. Parece muito relaxado para alguém que possuiu uma lâmina dentro do peito. Ou alguém com uma missão tão importante.
-Na verdade, eu sempre faço isso para lidar com meus problemas. Ser triste não resolveria muito. Se bem que agir como eu era antes, também não era nada saudável. Igual a um tolo. Você viu um pouco desses modos.
-Deveria ser um arrogante e ignorante homem.
-Obrigado, mas não era bem assim.
-Era sim! – disse um Thror bem bêbado. Foi silenciado por Seton com sua mão.
-Muito grato meu amigo guerreiro. Continuando... Já agi de formas inapropriadas. Até pensei em trair meus atuais companheiros. Isso ocorreu por influência de um dos itens malditos. Um dos artefatos do Desalmado. O que não me redime dos meus pecados. E os erros de minha linhagem. Só que isso já me custou minha família. Todos que amei e conheci desde quando era criança pereceram diante de mim. Da pior forma possível.
-O que ocorreu contigo mago? Sinto um pouco de raiva nas suas palavras.
-De mim mesmo talvez.
-É um Van Kristen não é?
Bebeu um belo gole de seu próprio odre. Sua boca se encheu com o vinho. Parecia fazer algum bem para si. Como se precisasse muito mais daquilo para lhe deixar melhor.
-Sou do sangue Van Kristen.
-Uma maldição esta em seu sangue. Assim como no meu.
-Quer dizer em nossos nomes? Por isso você não utiliza seu nome verdadeiro. Nunca soube que entre os membros dos Imortais Esquecidos haveria um Homem Santo. E me lembro de todos. Esse termo me parece coisa de um cristão. Mas parece servir Kanglor.
-Leu o livro de Gibraltan pelo jeito.
-Sim.
-Não acredite muito naquele louco.
-Mas ele é um dos membros do Conselho Arcano de Avalon.
-Sim.
-E quer que acredite em você – disse isso olhando bem seu anfitrião – mais do que em um arquimago?
-Sim.
-Nem deveria ter lhe entregado o odre.
O estranho encarou Lacktum com um sorriso. Depois se ajeitou melhor contra a parede.
-Você não conhece aquele velho louco como eu rapaz, rapaz. Quando ele era mais novo... Digamos que ele gostava te saber como o mundo iria acabar. Nunca confie em um homem gordo que gosta de se vestir bem o tempo todo.
-Isso eu realmente não compreendi.
-Leia mais atentamente os textos rapaz. Leia. Pois mesmo nem tudo sendo verdade, alguns fatos têm certo sentido.
-Como alguns de vocês ressurgindo no ano mil pelo calendário dos cristãos?
-Exato!
Os homens, anões e o elfo, agora se voltavam para conversa entre aqueles dois. Uma afinidade entre o jovem e o suposto guerreiro era clara. Na verdade, alguns ali tinham certeza tratar-se de um paladino. Devido ao fato de ter curado o mago usando sua voz somente. Como se atendido pela divindade. Talvez até demais.
Lacktum perguntou:
-Por qual motivo se isolou nas terras do Norte? Em um lugar tão gélido...
E ele puxou pela memória, nos recantos dela, fragmentos de algo único. Uma batalha não registrada em nenhum livro. Óbvio. Todos os livros que possuem um final feliz, mesmo que fraco, nunca terminam naquele ponto. A personagem continua enfrentando os desafios impostos pela vida. E se o os fatos forem mesmo baseados na realidade, nem sempre conseguem a vitória. Muitas vezes os textos tratam somente da glória deles. Os transformando em invencíveis. Pobres tolos são os leitores que crêem nisso.
Todos que estavam na caverna pararam o que faziam para escutar. Apenas Thror estava no chão, bêbado e estirado pelo bom vinho tomado antes. Até a fogueira crepitava com menos força, ao que parecia. Tudo se silenciou para que o Homem Santo. Pudesse falar. E quando aqueles lábios se mexeram estava óbvio que muita dor ocorreu com eles. Pois muito amor também esteve com ele.
-Eu tinha uma família depois do último conflito contra Hades. Minha mulher Illyana, era uma elfa que servia Ixxanon. Um grande aliado naqueles conflitos e que ascendeu devido a mim e aos outros. Com a paz que obtivemos foi possível termos filhos. A eles nomeamos Kamui e Youko – riu rapidamente, mas ele voltou ao seu rosto seco – Eu pedi ajuda para Shizuko. Enfim, pensamos que não pegaríamos tão cedo em uma arma. Só que uma guerra estava para eclodir no horizonte. O papa Urbano II conseguiu convencer em especial a aristocracia dos francos, para partir em 1096 e chegar até Constantinopla. Inclusive, tropas saqueavam a fim de conseguir se alimentar sem pudor ou piedade. Assim foi a primeira Cruzada. Com o grande número de pessoas partindo para a Terra Santa, devido indulgências, aqueles que eram poderosos o suficiente se preparavam. Sim, pois todos notavam que algo foi tramado nas sombras. Os mais pobres não detinham conhecimento sobre a Bíblia. Nela matar ou comentar atos malignos. Não faria sentido então essa investida. Fazendo os mais humildes partirem nessa viagem sem sentido. De qualquer forma eu e os Imortais nos colocamos a disposição dos mais aflitos. Foi quando descobrimos quem tramava isso. Kalic Benton – respirou um pouco e deu um gole grande no odre. Todos observavam cada palavra proferida com muito cuidado – Havia um plano dele de dominar a cidade de York. Eu como um paladino, me prontifiquei a enfrentar o exército desse ser decadente. O problema é que minha amada me seguiu. Antes não tivesse feito isso. Até hoje tenho pesadelos com aquilo. Ao redor daquele feudo, nas sombras, ogros e mortos famintos nos atacavam. Parecido com aquilo que ocorre agora nas terras inglesas e outras. Muitos dos vivos eram bem treinados. Nada que cada um de nos não soubéssemos lidar. Só que de alguma forma, o miserável conhecido conseguiu se esconder entre os seus servos. Um cavaleiro sem honra é o que digo. Pois nenhum que conheci usaria tal subterfúgio. Não imaginando que havia um inimigo tão perigoso me afastei dela. Ela me convenceu me lembrando de uma história, um conto de uma fada que queria ser humana. Tratava-se da lenda de Karin. Falado isso, eu teria saído de perto dela. Essa parte me ficou vaga na memória. E foi quando... – entre soluços ele continuou – Ainda sinto o sangue de minha amada nessas mãos. Sem mais poder curativo eu gritei de raiva. O desgraçado se vangloriava disso! Então, eu fui um servo perfeito de Kanglor, pois minha ira nunca foi tanta. Pelos deuses... Como eu o odeio.
-Eu entendo como se sente... A sua sorte é que tem um modo de se vingar. Ou melhor, já o fez.
-Para eliminar um inimigo como Kalic, necessito de um pedaço de sua arma. Isso é a forma definitiva. Mas nunca a tive.
-Pedaço de sua arma? – questionou curioso o jovem Lacktum.
O imortal assentiu com a cabeça de forma bem devagar.
Enfim, ele levantou. O tal paladino mexeu nos cabelos e encarou todos os Dragões.
-Saibam que os irei treinar. Só que para isso partiremos para Avalon.
Todos ficaram espantados. Gustavo até gritou de satisfação:
-Seremos treinados por um verdadeiro herói!
Aquele homem riu da frase. Nunca acreditou naquela idéia. Não era um herói para si mesmo. Queria só ajudar os tolos jovens que vieram até ele. Só não disse isso, pois poderia diminuir a empolgação no coração de cada um.

Fora da caverna se encontravam Siegfried e Gustavo. Os dois aventureiros observavam ao longe a vila de que vieram. Parecia até que calma, especialmente depois de toda a neve caída. Lembraram do que viram ali.
-Você passou por aquela vila com Lacktum? – perguntou o paladino.
-Sim. Estava completamente devastada.
-Não é para tanto.
-Você não viu o medo que eles continham em seus olhos?
-Ah certo! Diz desse modo...
Os dois estavam apoiados em pedras contemplando toda aquela extensão de terras cobertas por neve. Mesmo na noite, o lugar possuía um tom mais azulado. Não que as terras de onde vieram possuíssem pouco ou nenhum gelo. É que aquele lugar parecia mágico.
Terras de invasores alguns diriam. Com aquele território notaram que uma sensação surgia. Lembrava sons de tambores. Recordavam-se dos textos sobre os antigos vikings e huskalars[1]que ouviram em histórias e lendas. Sobre como o corpo de alguns homens daquele local era protegido por Odin. Em alguns momentos sentiam que seu coração queimava com esses relatos das épocas passadas.
-Ei! Aceitam um pouco mais de bebida?
Quando ouviram isso, foi notável a aparição de tom ao lado deles. Carregava dois odres.
-Eu aceito um pouco – falou Siegfried tirando um dos itens da mão do clérigo de Zeus.
O paladino aproveitou e fez isso também. Parecia que não se tratava de vinho.
-O Deenar me entregou. Disse que é hidromel. Não sei do que é feito, mas é bom – completou Tom.
-Realmente. E onde Thror esta? – perguntou Gustavo temeroso.
-Ele esta dormindo. Sempre foi fraco para bebidas aquele sujeito?
-Desde que o conheço...
-Parece ser um rapaz bem engraçado – soltou Siegfried.
-Isso ele é! – falou rindo o paladino – E um ótimo combatente.
Os três começaram a rir. Talvez por conta do jeito como agia o bom Thror. Ou quem sabe foi efeito das bebidas. Tanto faz. Estavam alegres de verdade. Era o que importava.
Eles se voltaram para a entrada da caverna. Onde estava cravada na neve como se fosse uma bainha, aquela espada. Todos ali acreditam que deveria ser uma arma do Homem Santo.
Após um bom tempo dos três ficarem em silêncio, Gustavo quebrou:
-Não sei se já ouviram falar, mas acredito que aquilo é uma lâmina sagrada.
Tom se espantou. Já Siegfried, claramente ficou confuso e pediu respostas.
-Uma lâmina sagrada – disse Tom puxando um pouco de seus conhecimentos – é uma arma que uma divindade concede a um de seus servos mais fiel. Muitos confudem isso com um adorador poderoso. Esse item só é entregue quem realmente acredita nos preceitos antigos.
-Não é a toa que ele é tratado como Homem Santo! – disse um espantado Siegfried.
-Bem, não tenho certeza se é por isso que o tratam assim – falou Gustavo com a mão no queixo, de forma pensativa – Talvez seja por outro motivo. Lembre-se que muitos ainda acreditam nos deuses antigos aqui. O termo santo não seria usado por eles.
-E a tristeza que sentiu? Que maldito deve ser Kalic Benton. Vingança nunca funciona. Nem para lidar com quem feriu ou nos tirou quem amamos.
-Para falar assim, eu sinto que possui uma mulher no coração. Deve ser isso.
-Não exatamente – disse timidamente o guerreiro do norte – Eu tenho em minha cabeça uma jovem linda que conheci naquela vila.
Nesse instante, Tom bateu nas costas do homem com certa empolgação.
-Ora! Se não é Eros atuando sobre o nosso valoroso guerreiro. Como se chama a dama? – perguntou o sacerdote.
-Hilde.
-Ora, ora! Assim como eu também me enamorei por uma jovem curandeira. De lá também. Valquíria.
-E não é bom? E você paladino? Tem alguém em mente?
-Fiz voto de castidade – respondeu prontamente o guerreiro divino.
Tom e Siegfried se calaram. Era raro ouvir isso de uma pessoa tão jovem.
-Mas não lhe faz falta? Digo o calor de uma mulher?
-Nunca. Se acharem que é difícil para mim, conversem com Arctus. Ele nunca possuiu sequer uma família. É um irmão que nem tenho mais. Tento sempre fazer o bem com ele. E para ele.
-Não fale desse modo tão serio. Ou vamos parecer duas crianças em comparação a você – disse Siegfried com certo ar de infantilidade.
-Eu não me importo – falou rapidamente o clérigo com um sorriso malicioso e juvenil.
Siegfried o encarou com raiva. Gustavo riu do constrangimento do homem que sempre viveu no norte. E mais uma vez riram todos.
-Vamos dormir. Estamos muito bêbados ou cansados – pediu o paladino.
Concordaram depois de muito rirem dos fatos anteriores.
Cada um foi caminhando até entrada da caverna. Bem lentamente, de modo que não escorregassem ou batesse em algo alguém.
Primeiramente foi Tom. Falava bem alto até. Obviamente era o mais embriagado dos três. E ainda fez piada de Thror por seu sono forçado pela bebida.
Em seguida, Siegfried desceu. Bem mais calado e cheio de cuidado. Porém, como todo bom guerreiro, era barulhento. Mesmo quando tentava manter o silêncio. Além de pisar uma vez ou outra na mão – ou outra parte do corpo – de alguém.
Gustavo se demorou um pouco mais. Abaixou-se um pouco diante da entrada e olhou aquela lâmina.
Lhe fez lembrar-se dos combates até então. Pensou como ele seria digno de uma arma igual aquela. Lembrou de itens como a espada de Carlos Magno ou a de Arthur Pendragon. Dizem que elas concediam propriedades místicas ao usuário. Um dia seria ele o portador de tal honra. Outro detalhe é que não reconhecia aqueles símbolos. Era realmente material de fonte atlante.
-Kanglor... Não pode ser...
Eis que ouviu o som de um dos membros dos Dragões para que entrasse. Ele o fez deixando a misteriosa arma para trás.

Todos dormiam bem, até que logo cedo ouviram os gritos de Deenar. Parecia apavorado com algo.
-Pare de gritar anão louco! Não nota que estou dormindo? – disse um Thror com uma horrível ressaca.
Ignorou aquilo e foi aonde seu mestre dormia. Todos usavam cobertas, ele usava uma grande parcela.
-Acorde mestre! Acuda a vila! – ele gritava enquanto balançava o homem. Esse depois de alguns empurrões desperta com raiva. Questiona o motivo daquelas atitudes infantis.
-A vila meu senhor! Esta sendo atacada! Daqui vejo fogo. E temo ser visto a asa de um dragão.
-Como? – muitos soltaram. Despertando lentamente alguns. Ainda assim isso lhes fez levantar.
Todos, mesmo não conseguindo colocar suas roupas, chegaram até a saída da caverna. Transtornados e com medo que o lugar que pensavam estar a salvo fosse destruído. Algo que os mais antigos acreditavam não ser uma coincidência. Já eram calejados em fatos inusitados. Os Dragões acreditavam que isso poderia estar relacionado a eles.
O frio não foi problema, pois nem se importavam com esse fato. Só queriam confirmar o que Deenar falou.
Finalmente alcançaram a saída. E qual não foi à surpresa de todos quando nuvens da fumaça mais negra que já viram subiam. E era na direção da vila.
Com algum esforço Lacktum forçou a visão. Então notou um par de asas negras.
-Daehim! Seu maldito!

Hilde levantava a curandeira Valquíria. Estava ferida gravemente. Isso ocorreu, não devido aos ataques do monstro com força tremenda, ou por conta do dragão. Tratava-se de uma viga poderosa em cima da perna. A jovem, no entanto era resistente, pois agüentava aquela dor tremenda.
A vila estava sendo atacada só por duas criaturas. Ainda assim quebraram uma boa parte do templo. Suas armas eram só um machado poderoso, garras e o sopro maligno de um dragão. Era impensável, se não estivesse ocorrendo de verdade com elas. E com seu povo.
Sabiam que não poderiam lutar. Fugir também não seria uma opção que duraria.
Ficaram em um dos becos na cidade. Queriam ter um lugar para descansar. Já que em seguida teriam que fugir para algum lugar. Aonde, não imaginavam. Eram criaturas enormes, e que facilmente alcançariam qualquer ser vivo. Em especial o dragão. Ainda se mantinham escondidas de qualquer maneira.
A jovem pediu que a amiga ficasse parada. Levantou a saia e observou onde estava ferido. Estava feio o local do golpe.
-Puxe – pediu Valquíria para sua amiga. Hilde entendeu que era para puxar a perna ferida.
-Não prefere que façamos isso fora daqui?
-Faça! – exigiu a jovem.
Eis que Hilde olhou para aquele ponto ferido. Mesmo com pena da amiga faz seu pedido. O gritp só não foi maior, pois foi abafado pelos sons do ataque daqueles monstros.
Não só os golpes daquelas bestas malditas. Havia também os lamentos das mulheres, jovens e idosas. Vez ou outra, um homem tentava atacar aqueles seres. Só gritos de morte eram ouvidos em seguida. Pena os homens estarem em viagem. Assim como os aventureiros, que se prontificaram a salvar todos dos ogros. Deveriam estar mortos.
Valquíria pediu que corressem dali. Sua amiga deteve seu ímpeto. Teria que ir com calma aquela perna. Poderia ser forte, não imortal.
-Onde esta a velha Urda? – perguntou Valquíria querendo ignorar a dor.
-Eu não sei. Desapareceu. Antes mesmo do ataque. O que me faz crer que ela adivinhou que haveria um ataque.
-Bem coisa de Urda.
Respiravam bem. Tentavam se tranqüilizar com o mal em sua volta. Valquíria mais uma vez encarou a amiga.
-Será que aqueles aventureiros estão vivos? Digo como o tal Tom que me ajudou?
-Esta com saudades do tal sacerdote grego? – com um sorriso inapropriado para o momento.
-Lógico que não! Só imagino que poderia nos ajudar. Assim como os grupos que passaram aqui.
-Isso é verdade...
-Esta se lembrando do guerreiro de cabelos negros?
-Como sabe disso? – questionou Hilde extremamente tímida – Quer disser...
-A vila é pequena minha amiga. E você é filha do líder daqui...
Enquanto falavam só ouviram o golpe do machado, próximo de suas cabeças. Era o perigoso ogro que notou onde estavam as moças. Elas gritaram de pavor devido ao ataque mal sucedido.
-Ora essa. Matadouro encontrar presas com forma de mulheres. Vocês falar muito e cheirar a medo.
Hilde empurrou sua amiga gritando:
-Vai Valquíria!
A jovem ferida gritava e chorava. Tanto pela dor, como pelo desespero. Talvez por sua culpa Hilde morreria.
Contudo a fortuna de ambas era alta.
Quando o temível ogro tentou mais um ataque, foi travado pelo pouco espaço do beco. Isso concedeu tempo suficiente para as duas jovens escaparem. Obviamente deixando o inimigo irado, até demais.
Elas saíram do lugar fechado. Estavam em lugar aberto agora, o que poderia ser um grande problema. Já que quando aquele monstro saísse daquele ponto iria atacar com tudo. Tirando que o dragão poderia vir naquela direção.
A simples Valquíria tinha um plano, quando observou para certa direção. Lá havia itens para uma armadilha.

Matadouro havia chegado até o lugar aberto. Onde acreditava estarem suas presas. Pensou então que seria inútil, pois com certeza fugiram. Qual não foi sua surpresa quando notou uma delas no chão. Era o momento de aproveitar.
-Mulher humana deve ser apetitoso. Outra ser bem covarde. Covardia tem bom tempero.
O ogro não notou um plano contra ele. Havia uma grande quantidade de toras de madeira em uma esquina que descia até onde ele estava. E a filha do líder foi até lá para fazê-las rolar. Lógico, colocando antes sua amiga em uma área segura. Assim mesmo Valquíria pediu para ser uma isca. Se algo falhasse, ao menos uma sobreviveria.
Ao notar que o ogro estava no campo onde seria atingido começou a empurrar aquela madeira. Era um esforço tremendo. Nunca foi acostumada em mexer com tanto peso de uma vez. Suas mãos poderiam lhe ajudar, no entanto, já que sempre fazia o possível para trabalhar. Era esforçada.
Enquanto tentava fazer rolar aquelas coisas Matadouro se aproximava. Se Hilde não fizesse algo logo sua amiga seria devorada por um monstro. Amaldiçoou a si mesma por nascer mulher. Nascendo como homem teria um modo de combater. Ainda assim, ela sabia como lidar com sujeitos atrevidos. Não com monstros.
Finalmente, aqueles malditos pedaços de madeira estavam soltando-se. Notou isso pelos estalos. Tinha que tomar cuidado para não alertar aquele inimigo. Um milagre ocorreu então, pois as terras rolaram e Matadouro foi pego no truque.
Sem ter como se esquivar aquela imensa pilha de madeira o esmagou só se ouviu seu grunhido. Só se ouviu grunhido. Valquíria só torcia que não morresse como seu perseguidor. Sua sorte continuava ali.
O mais rápido que pode, Valquíria foi à direção de Hilde. Essa fez o mesmo, para auxiliar sua amiga que mancava.
-Esta bem Valquíria?
-Na medida do possível Hilde.
-Vamos. Se apóie em mim. Vamos conseguir ajuda.
Antes que saíssem daquele lugar a jovem curandeira notou algo estranho. Que não notasse aquilo.
-Espere... Onde esta o sangue?
-Do que esta falando? – a outra se sentiu confusa.
-Não há sangue. Nem pele. Ou sequer um osso. Eu já vi meu pai trazendo esses monstros até aqui. Pedaços deles. E eles têm um sangue verde. Por acaso viu alguma marca assim?
-Deve estar debaixo das toras. Esqueça.
-Não estar não – ouviram com temor atrás delas.
Quando se viraram não queriam acreditar naquilo. O escutaram poucas vezes, mas sabiam que era ele. Nem conseguiam fazer idéia de como, mas se tratava do ogro.
Finalmente encararam o fato que a voz tinha atrás delas. Compreenderam ao olhar para aquele lado que ele estava vivo.
Ao virara seus rostos, uma fumaça espessa surgia. Pior que isso, do tamanho de Matadouro. Era grande o bastante, para cobrir um ser humano comum. Isso já deixava ambas apavoradas, só que não era isso apenas. Além disso, vez ou outra pareciam surgir partes do corpo da mesma criatura que as seguiram.
Aquela fumaça, com certa lentidão, foi tomando uma forma humanóide. Enquanto isso ocorria as garotas subiam na área onde antes havia a pilha de madeira. Só que foram impedidos pelo imenso machado do perseguidor monstruoso.
Parecia que pelo menos o braço já estava em uma forma estável. Cada fração daquela fumaça começava a criar uma silhueta. Uma vez ou outra enxergavam brasas, como de uma fogueira. Era claro que uma grande habilidade mágica foi usada. Mesmo sabendo tão pouco sobre esse assunto. Enfim, o inimigo estava vivo, na frente dela.
Ele se abaixou de forma com que pegasse impulso para algo. Era um salto, pois no instante seguinte a ter feito isso, ele caiu próximo delas.
-Surpresa presas. Vocês terem gosto de galinha ou cavalo?
Ambas ficaram paralisadas pelo medo. Em um ato de extrema coragem, Valquíria lança Hilde para longe, com sua baixa força. De raiva o ogro golpeia-a. isso a faz se lançada em outra área aberta. Desacordada, no entanto.
-Valquíria! – gritou a desesperada moça notando que a amiga poderia estar morta.
O ogro tirou seu machado do chão com certo esforço. Caminhou de uma forma sinistra e arrastada até perto de Hilde. Levantou seu machado para trás.
Era notável que sua vítima chorava e soluçava. Ele antes que desferisse o golpe solta de forma pervertida:
-Lágrimas temperam as presas.
-Meça suas palavras criatura!
As palavras mal foram ouvidas quando ataque ocorreu. Contra Matadouro.
Um golpe surgiu do nada. Proveniente de um homem portando escudo. Na verdade, aquele homem usou aquela defesa como arma. Fazendo o monstro se afastar um pouco. Uma marca forte no rosto surgiu naquele ser.
-Quem ser você? – exigiu aquele ser.
Atrás do homem se encontravam os novos Dragões da Justiça. Era o suposto Homem Santo o defensor da jovem. Todos armados.
Ele levantou Valquíria a despertando. Quando o fez tomou muito cuidado.
-Esse tipo de criatura sente prazer com o medo – disse o homem a jovem.
-Obrigado Homem Santo.
-QUEM SER VOCÊ? – exigiu de forma furiosa.
Os olhos do homem voltaram para aquele ser. Dentro deles, Matadouro encarou muitas coisas que lhe deixaram apavorado. Era do mesmo modo quando se encara alguém com um passado terrível de difícil. E só pelo olhar, uma pessoa nota todo sofrimento no coração da outra. Essa sensação apavorante fez o ogro vacilar.
Abaixo do casaco de peles havia uma armadura poderosa. Com várias placas forjadas e encaixadas de modo a recobrir seu corpo todo. Havia manoplas cheias de detalhes, botas pesadas de couro cheias de barro e um cinto reforçado. Correias e fivelas distribuem o peso igualmente, sem atrapalhar seu movimento. Um grande escudo ficava em seu antebraço. Feito de metal, mas possuía um brasão com um símbolo em madeira. Um lobo branco. Não fosse pela barba mal cuidada, muitos diriam se tratar de um rei.
-O meu nome não lhe interessa. E mesmo que lhe contasse fera, de nada serviria. Eu não o concedo a ouvidos dos mortos.
Lacktum riu e gostou do que ouviu. Assim como Tom. Thror e Bahamunt nada entenderam. Já estavam se acostumando com tudo aquilo, inclusive em relação ao elfo louco.
-Vá para outro lugar minha jovem. Deenar esta auxiliando os mais feridos. Leve sua amiga.
E assim o fez. Despertou a colega e falou para fugirem. Logo depois tentaram correr.
Tanto Siegfried, quanto Tom haviam notado de quem se tratava. Só observaram e falaram rapidamente. Agradeceram na frente de ambas, aos deuses, por elas estarem vivas. O momento alegre foi interrompido. Já que as jovens tinham que se cuidar. E os aventureiros terminar um assunto.
-E vocês achar justo tantos contra um? – falou o grande ogro.
Houve um grito de fúria por parte daquele homem poderoso e perigoso.
-E acha justo atacar duas moças indefesas? Agora me deixe lhe mostrar o que é pânico.
Um silêncio sepulcral caiu entre o herói sem um nome o membro do bando de Sinestro.
Eis que surge entre eles um elfo negro. Ou ao menos era o que muitos ali pensavam.
-Desculpe interromper.
-Daehim! Praga dos infernos! – gritou o mago Lacktum.
-Calma meu amigo arcano! – soltou Ulfgar – Pelo que me falou esse é o tal dragão que enfrentou?
O jovem de cabelos vermelhos assentiu com a cabeça.
-Ora essa. Comentou do Vale das Esmeraldas e de nosso pequeno e primeiro encontro? E como os humilhei? Disso não deve ter falado.
Uma raiva tremenda surgiu naqueles que participaram daquele combate.
-Deixemos o passado de lado. Você deve ser o tal Homem Santo do norte. Prazer – e ao falar isso se curvou em referência – Nós temos algumas coisas para tratar com os Dragões. Poderia se afastar? Só um pouco?
O antigo membro dos Imortais Esquecidos ficou calado, impassível. Sua resposta, naquele momento, com certeza era não.
-Bem... Eu tentei ser educado. Vocês viram. Não viram? Nunca digam que Vento Gélido é um mal educado. Mesmo entre vocês mortais, minha palavra é perfeita. Esta vendo isso? – o dragão em forma de elfo levantou uma caixa de forma quadrada e com pequenos filamentos saindo da mesma – Sinestro mandou isso como lembrança. Disse-me que é a Caixa do Renascido Infernal ou Chave do Pandemônio. Você sabe do que isso se trata na realidade? Um detalhe: eu soltei o que estava aqui dentro.
O poderoso paladino se enfureceu mais uma vez. E dessa se conteve.
-Dragões. Terei que deixar esses dois para vocês. Mas creiam que voltarei quando for possível. Esses loucos soltaram um lorde infernal na vila.
-Hilde! – disse Siegfried atônito.
-E Valquíria falou apavorado Tom.
-Temos que ir até lá! – exigiu Lacktum.
-Não – falou o Homem Santo.
-Como não? – questionou Arctus – Estes seres estão aqui por nossa causa!
-Eu sei. Mas o que querem é nos dividir. Vocês enfrentam o ogro mago e o dragão. Lidarei com o demônio.
Quando decretou aquilo cruzou o caminho entre os jovens aventureiros. Levantou sua mão, um brilho dourado surgiu. Através dela era possível se sentir paz e confiança.
Então que enquanto sentiam aquela aura benigna afetando todo o lugar, a poderosa lâmina surgiu feito um fantasma. Ela zuniu feito uma flecha atirada pelo melhor arqueiro. Se qualquer outro tentasse segurar semelhante artefato talvez tivesse seus dedos decepados instantaneamente. Porém, isso não ocorreu com ele. Pois era um paladino poderoso, um campeão consagrado pelas forças do bem.
Ainda estava cheia dos pedaços de gelo onde foi depositada por tanto tempo. Só que agora, eram notáveis detalhes no corte da arma e seu cabo. Havia um rubi em sua guarda. A extremidade onde se segurava aquela arma tinha forma de um lobo branco e faminto. E a sua lâmina ficava mais bela devido a escritos. Era a língua dos dragões e da desaparecida Atlântida.
-Antes que eu parta devo me apresentar... Chamaram-me por vários títulos. Bons ou maus – ainda de costas aos Dragões da Justiça continuou sua fala – Paladino Covarde, Maneta, Aquele que Tombou, Espada Perdida, Lobo Sagrado, Cão Branco, Amigo de Ixxanon, Paladino da Ira... Meu irmão me tratava por Pequeno Pombo... Recebi esse nome de meu pai, Edward Gawain III. Sou o único paladino de Kanglor nessas terras, James Gawain.
Ao terminar te falar isso, o paladino correu para derrotar aquele mal.
Daehim riu.
-O mais forte entre vocês fugiu. Agora não terão mais chances.
Lacktum se virou com um rosto cheio de confiança.
-Você sabe que aquele homem nunca revelava seu nome. Só outros Imortais Esquecidos conheciam esse segredo. Ele revelou isso por saber que não morreremos como disse para Matadouro. Mas o fez, em especial por confiar em nós. Além disso, Gawain é um conhecido eliminador de demônios.
-Muito bem, vamos ver se terá a mesma confiança depois que farei. Matadouro! Se levante.
O ogro fez isso prontamente.
-Dragões preparem-se!

Cada um dos jovens heróis cercou os dois membros do Pacto de Guerra. Ao redor de Matadouro ficaram Tom, Siegfried e Ulfgar. Daehim tinha como seus adversários Gustavo, Bahamunt, Seton, Thror e Lacktum. Estavam motivados. O dragão assumiu sua forma verdadeira em instantes.
O ogro colocou seu machado na frente usando seu tamanho como vantagem. Criando uma linha imaginária na sua frente. Impedindo um ataque direto. Até que funcionaria se não fosse plano dos três.
Em um salto, Siegfried usando duas mãos na armas partiu para o ataque. Enquanto ele fazia isso, o anão corria por baixo com seu martelo. Um truque fatal, já que ambos poderiam acertar seu alvo. Só que um deles seria atingido.
O escolhido foi Siegfried.
Seu golpe tinha sido detido pelo machado do ogro. Ele acertou o guerreiro humano, mas não de um modo fatal. Deixando o caminho livre para Ulfgar, paladino de Thor. Ele teve uma surpresa, ao descobrir que seu inimigo girou o corpo todo com sua arma. O que significava um novo ataque logo.
Aquele monstro girou em torno de si mesmo com o item cortante. Assim lhe concedendo uma nova chance de golpe. Por um milagre, foi detido pelo martelo do servo de Thor.
Os dois se mantiveram em disputa entres armas. Ulfgar com um simples item de combate. Enquanto Matadouro carregava claramente uma força arcana. Não fosse pelo ataque com ímpeto do anão, talvez tivesse seu crânio partido. Uma disputa entre ambos.
Eis que a lâmina de Tom acertou o lado esquerdo daquele monstro.
-Ataque pelo flanco. Minha especialidade.
De um momento para o outro, aquele ser estava encurralado. E com um corte imenso.
Do outro lado, estava Daehim. Cercado por um número bem maior de inimigos, ele flutuou um pouco. Assim dificultava os ataques alguns como Gustavo.
-Não tenho nenhum arco – reclamou o paladino de Deus – Desde que combateram o kraken.
-Que pena, pois eu tenho! – soltou um feliz Thror atacando.
O guerreiro careca disparou sem sucesso no antigo inimigo. Ainda que fosse bom com arco, não acertou.
-Ninguém é tão bom quanto um elfo com arco.
Quando isso ocorreu, uma flecha cruzou o ar. Acompanhado de mais duas. A primeira não obteve o sucesso desejado. Diferente das outras, em que uma atingiu a pata inferior esquerda e outra, o que vagamente lembrava um ombro. A anatomia daqueles seres não era muito perfeita. Para padrões humanóides.
-É a minha vez! – falado isso, o mago esticou sua mão para trás. Ele formou um chicote de pura energia com calor. Sua magia predileta. A força arcana se tornou uma língua de chamas atingindo o oponente que voava.
Mesmo sendo um dragão, Daehim estava se sentindo muito acuado. Pois aquela magia que o mortal soltou era tremendamente poderosa. Ainda que para padrões tão baixo quanto o dos humanos. Aquele arcano aumentou seus poderes e bastante.
Seton aproveitou e bateu as mãos no chão levantando algumas plantas. Queriam aprisionar a monstruosidade alada. Só que os reflexos de Daehim ainda eram superiores. Não obteve sucesso nesse truque.
O dragão agora atacava. Inflou seu peito com grande força. Disparou de sua bocarra um jato de chamas negras poderosas e perigosas.
Todos fugiram do golpe daquele sopor, com exceção de Arctus. Este usou um poderoso encanto impedindo um ataque de chamas contra si. Mesmo as negras.
-Estava preparado para você. Por muito tempo! – gritou o sacerdote batendo o punho que estava com a arma no peito.
Desse jeito o dragão fez um golpe em rasante como resposta a bravata. As asas fizeram boa parte dos jovens serem lançados para longe. Com exceção de Lacktum e Thror.
Ainda assim, Bahamunt no chão disparou uma de suas flechas. Na verdade, como antes foram mais de uma. Todas juntas. Acertaram aquele enorme corpo de besta.
O mago levantou um dos seus pulsos, e quando o fez, uma esfera de chamas surgiu. Poderosa e grande o suficiente para cobrir uma pequena casa. E a iria lançar com toda a sua força remanescente.
-Da outra vez eu não usei isso, pois estávamos em lugar fechado – disse rindo aquele jovem – Só que dessa vez, nada me impede.
Houve o lançamento da grande bola de fogo. E enfim atingiu o monstro. Como um inimigo tão pequeno obteve um resultado tão grandioso, questionaria Daehim. Pois com isso, o dragão caiu nochão.
Ele se mantinha em pé com relativa dificuldade. Os jovens eram perigosos. Aquilo o forçava a usar mana. Nunca imaginou que necessitaria disso.
Com um simples agitar de sua garra uma magia atingiu vários de uma só vez. Era pura energia elétrica. Só atingiu os Dragões da Justiça. Eles de debatiam pela dor como se alguém forçasse a carne de cada um. Todos caíram.
Era possível ouvir o sorriso de Matadouro e sua voz cruel:
-Parece que estes Dragões parecer um bando de salamandras – e ao falar isso, o ogro chutou o corpo do clérigo de Zeus – Esse aqui parecia que iria trazer problema.
Ficou de costas para Tom. Sem perceber um movimento atrás de si, Matadouro foi atingido. Na perna esquerda para ser mais preciso.
-Argh! – gritou a criatura pela dor causada. Em seguida rolou para longe do seu inimigo.
Tom se regozijou:
-Acha mesmo que eu deixaria você impune depois do que causou aquelas jovens? Depois que eu terminar com você, eu mesmo pegarei as presas daquela serpente de asas.

Mais lentamente, os outros jovens foram levantando. Lacktum gritou para alertar.
-Vamos! Rápido! Vai demorar a ele atacar com o sopro de novo.
Enquanto faziam isso, o machado de Matadouro disputava contra a espada do jovem Tom. Esse último deslizou sua arma para baixo – sendo que seu inimigo mantinha a defesa na horizontal – e se afastou em um salto. E em outro voltou atacando com sua lâmina. Além de acertar o golpe no ombro, seu item estava com uma magia elétrica poderosa. Foi quando o monstro se afastou.
O ogro mago colocou umas das mãos no ombro ferido. Ele bufou de raiva e dor.
-Você é o que?
-Tom Drake Harem. E leve esse nome para o Tártaro. Pois é o que merece.
Ele nunca teria sido apenas um homem comum.
Um pouco mais afastado, o cerco contra Daehim continuava. Parecia fazer um sucesso considerável.
O dragão, mesmo sabendo que eles estavam feridos notou algo. Eram muito mais perigosos que anteriormente. Mesmo com os novos membros, não achou que seria tão difícil com humanóides. Dragões são naturalmente poderosos. Desde que nascem. Sem um ser igual a ele. Pelo menos ali, nunca existiria.
-Vermes imundos! Deveriam se render. E então estender suas cabeças com seus pescoços diante de nós. Para nos alimentar com suas carnes.
Estranhamente, o elfo arqueiro riu.
-E dizem que o louco sou eu!
De longe, Ulfgar gritou.
-Mas você é! Essa criatura é prepotente! É diferente!
-Como ousam? Fazer piadas de uma criatura divina como eu!
-Senhor divino! – gritou o guerreiro Thror – Que tal resistir a dois golpes de espadas?
Falado isso, ele correu como um touro sem freio por baixo das patas traseiras de Daehim. O grito de dor causado na criatura era percebido por todos dentro da vila, já que o combatente acertou ambas ao mesmo tempo. Eram realmente arcanas. Além do corte, o dragão sofreu com forças que lembravam um trovão e um relâmpago.
Lacktum meio atordoado olhou para o guerreiro e se apoiou nele.
-Trovoada e relampejar? – disse o mago.
-Trovoada e relampejar! – respondeu o amigo combatente.
O combate entre Tom e Matadouro chegava próximo de um fim. O clérigo rodeava aquele ogro como uma fera próxima do momento certo de um bote. Os papéis haviam se invertido.
Quem iniciasse o próximo golpe não importava. Mas quem o terminaria sim. Se bem que o sacerdote não estava tão ferido como o seu oponente.
E em um instante, quase tão rápido quanto uma gota de água caindo, a espada de Tom atravessou o peito de Matadouro. A fera com aspectos de homem se ajoelhou não agüentando aquela dor. Como golpe de misericórdia, o executor tirou a lâmina do monstro lentamente. E em um corte seco, o decapitou.
-Pronto! Eliminei. Agora só me falta o dragão.

Não era possível. O ser que havia unificado ogros e goblins jazia caído no chão. Aquele acontecimento era intolerável. Inimaginável para alguns. Ao contrário, Daehim encarava um monstro humanóide jogado naquela terra. Haviam derrotado Matadouro. Ou melhor, um único homem.
Sem notar seu próprio aspecto, Tom caminhava até o dragão. Quando sua lâmina obteve sucesso, uma grande quantidade de sangue o cobria.  E o seu sorrido lhe concedia um aspecto quase demoníaco. Por ultimo, a espada sendo arrastada fazia pequenas faíscas voarem com o atrito.
-Obrigado Lacktum. Se ele tivesse usado alguma habilidade arcana... – falou Tom.
-Com certeza ele teria fugido – completou Lacktum – Ainda bem que alterei alguns aspectos da realidade, não acha?
-Lógico.
Foi isso que ocorreu. Era uma das habilidades de um mestro do destino. Já ouviu rumores de uma feiticeira que usava só tons rubros em suas vestimentas. Ela controlava as chances de algo ocorrer. Talvez seu aliado até quisesse usar seus dons, mas foi detido pelo poder de controlar a realidade. Lacktum estava poderoso nesse caminho.
Recuar era preciso.
Quando se deram conta, o dragão ficou de costas. Sem mais nem menos. Parecia que ele fugia dos pequeninos humanos. Eis que Lacktum grita:
-Não o deixem escapar seus tolos!
Era possível ver Tom correr na direção do monstro. Sem sucesso.
-Pelas tarefas de Hércules! Quase que eu pego essa fera!
-Sem problemas, mortal. Eu o faço – soltou um Bahamunt arrogante – Minhas flechas o acertarão.
Falado isso, uma saraivada de projéteis foi lançada pelo elfo. Ainda assim, nenhuma delas alcançou o objetivo.
Antes que pudesse ficar longe da vista de qualquer um ali, o Vento Gélido soltou uma última magia. Pedaços de um metal negro brotaram em pleno ar. Semelhantes a lanças.
Cada um dos Dragões de protegeu como conseguia. Siegfried ficou atrás de uma parte das casas. Lacktum criou uma barreira de energia que quase falhou. Tom bloqueou uma lança com a própria arma, mas notou que outra atingiu sua perna. Seton e Arctus saltaram para direções opostas. Ainda assim foram feridos. O primeiro no braço e o segundo no pescoço levemente. O tolo Thror ficou só preso, pois sua roupa foi rasgada pela magia. Já o paladino Gustavo deve mais sorte. Não foi pego por nenhuma delas.
Onde estavam, no entanto, o anão e o elfo? Depois da confusão, onde quer que o dragão esteja talvez tenha vitimado aqueles jovens. Daehim, o Covarde seria um titulo mais apropriado para aquele lagarto com asas. Mas caso aqueles dois estivessem mortos, o líder dos Dragões nunca se perdoaria.
Eis que quando Gustavo se virou para um lugar, ele conseguiu notar uma cena. No mínimo épica. Ele chamou a atenção dos outros.
Lá estavam o paladino e o arqueiro. Ulfgar segurava um escudo atravessado pela lança arcana. Isso acontecia, pois, o elfo foi protegido do ataque pelo colega. Quando os outros se aproximaram dele notaram que não somente a defesa foi trespassada. O braço do anão também.
Todos correram para acudir o anão. Gustavo auxiliou. Fez isso o segurando. Ao mesmo tempo em que temiam pela vida do amigo, eles exaltavam seu amigo. Uma atitude heróica.
-Grato anão! – soltou Bahamunt pela atitude do companheiro.
-Não quero o agradecimento de um orelhudo... – fala Ulfgar tentando resistir a dor – Só me faça um favor: nunca mais precise de meu escudo.
-Farei muito mais que isso! Muito mais que isso!

Após o conflito tudo se pacificou finalmente. Com certeza Daehim fugiu. Para o Pacto de Guerra. Ele quis criar desespero entre os dragões. Obteve coragem e atitude heróicas.
O anão foi rapidamente tratado e curado por Gustavo e Arctus. As outras pessoas da vila também foram cuidadas, incluindo Hilde e Valquíria. Mesmo o ferido Ulfgar foi prontamente curado. A única coisa que sobrou foi uma marca no braço onde usava o escudo.
Depois que o padre fez suas preces e restaurou a saúde do anão eis que Lacktum se aproximou dele.
-Ulfgar, como se sente?
-Como se tivesse um braço novo!
Os dois riram. Arctus não poderia parar. Ainda havia muitos feridos. Estavam debaixo da cobertura de uma casa. Além dos três aventureiros, e alguns aldeões estava Tom.
-Alias o clérigo do trovão grego bem que poderia ter ajudado.
Lacktum virou o rosto diretamente para onde estava Tom. O mesmo estava de costas.
-Por qual motivo não fez nada?
Sem se virar ele lhe respondeu prontamente:
-Foi para que eu guardasse meus dons para uma emergência.
O mago estranhou aquele fato. Mas ignorou. Pois como combatente ele era ótimos nisso. Praticamente, o duelo dele com Matadouro decidido por sua lâmina. Um pouco maior que o normal, por sinal aquela arma usada pelo clérigo.
Ele saiu do lugar em seguida. Foi procurar o resto de seu grupo. E quem sabe o paladino de Kanglor que não era visto um bom tempo.

Encontrou Thror, Gustavo e Bahamunt. Todos unidos em uma espécie de comemoração. O grego sentou em cima do corpo do ogro derrotado.
-Venha mago! Tome uma dose de vinho.
-Grato – se aproximou o arcano pegando aquele vinho – Onde está Seton? E Siegfried? – pegou um belo gole da bebida.
-Seton foi ajudar Deenar. Siegfried foi ajudar a moça que se chama Hilde. Parece que a tal de velha Urda sumiu – falou Gustavo.
-Entendo. Não vejo onde esta a cabeça do ogro.
-Esta ali – indicou o guerreiro grego para o centro do lugar.
O jovem mago de cabelos ruivos notou uma estranha figura onde Thror apontou. Em três das lanças de ferro estava a cabeça de Matadouro. Cheio de moscas e com presas faltando. E um olho saltando da face.
-Belo rosto! – disse Lacktum notando a cabeça trespassada.
-Verdade. Como era maior que o normal precisou de três lanças. E a magia do dragão não se dissipa – enquanto falava isso, Bahamunt parecia carregar um odre invisível.
Lacktum olhou para aquilo e questionou:
-O que esta fazendo elfo?
Gustavo e Thror riram.
-Ele disse que esta bebendo vinho élfico – falou Gustavo segurando o riso com uma das mãos.
-Compreendo... – disse Lacktum com certo medo das ações do arqueiro.
-Isso mesmo. Tome mortal. Todos merecem um gole dessa bebida que nos revitaliza – e quando disse isso estendeu a mão vazia para Lacktum.
-Não. Muito grato amigo – ao falar isso notou as risadas dos outros dois.
Depois de certo tempo ali, logo ouviram o som pesado de uma armadura surgindo. Seus olhos notaram aquele a quem chamavam de Homem Santo anteriormente. O semblante carregava uma felicidade completamente diferente de um dia atrás. A espada sagrada brilhava como o Farol de Alexandria alguns diziam.
Ele carregava junto a si um saco de tom marrom. Na parte de baixo dele havia um liquido meio negro, ao qual aproximando um pouco mais notariam tratar-se de sangue.
-Vejo que como eu, vocês tem preferência por decapitações – o homem disse.
-Verdade – disse Thror – Pegou como troféu?
-Diferente de vocês, jovens, não necessito disso. Isso aqui irá servir para alertar Avalon, Midgard, Arcádia e Moredhel. Faça-me um favor e leve isso para um lugar seguro. Faria isso guerreiro.
-Lógico. Mas se você arrancaria um dente pelo menos. Eu e Tom fizemos isso. Se bem que ele pegou o pedaço maior.
Levantou-se e carregou o saco. Com certa dificuldade. Parecia mais pesado que a careta de Matadouro.
Lacktum se aproximou do homem com aura de rei.
-Então estávamos diante de James Gawain, um dos líderes dos Imortais Esquecidos?
O homem riu. Em seguida bateu no ombro do mago com certa força, mas de forma amistosa.
-Sim. E você e seus homens fizeram me revelar. Apesar de que gostava de ser tratado como um sem nome. Pois na verdade nunca me senti um heróis. Agora vamos. Tenho muito a lhe falar. O lorde infernal me confidenciou algumas coisas. E acredite... Ele não ousaria mentir para mim. Um cavaleiro eliminador demoníaco.



[1] Guerreiros profissionais eram poucos, chamados como huskalars. Viking era uma ocupação que teria o significado de pirata ou bandoleiro.