quarta-feira, 26 de fevereiro de 2014

(EXTRA) Pensamentos em uma Caixa Cinza 9

Vivo
As palavras que soltamos no ar nem sempre são o que pensamos. Mas sempre tento passar o que penso no que falo. Parece até que essa minha língua presa fica solta quando falo o que sinto.
Meu coração é cheio de feridas. Cortes de todos os tipos. Já tive cortes das pessoas que me amavam, das que me odiavam, das que mentiram pra mim e das que acreditavam não mentir para mim. Eu sei o quanto fere uma palavra não dita, mas sei que um coração que não acredita no que fala não presta. Jogo fora.
Falam que eu sou louco, que eu faço as coisas de peito aberto. Então eu digo: qual um bom motivo para não se fazer isso? Para não se encher de lagrimas? Eu já enchi, transbordei. E sabe o que aconteceu? Ele transbordou de novo. E vai transbordar de novo... E de novo... E novamente! Pois é nele que eu deposito aquilo que é mais importante para mim: minha fé nos outros.


Um bom dia
Há uma musica que toca meu coração. Ela se parece com tantas outras. Meu dia estava tão triste. E de repente um pássaro voou. Eu sei que pressentimentos não deveriam existir. Eu já na estrela cadente, nem nos pedidos que eu fiz a santa. Mas só por hoje quero crer que tudo vai se encaixar.



Vou me embora para Gonçalves
Vou me embora para Gonçalves
Lá sou amigo de um fazendeiro
Lá tomo leite direto da vaca
E sou tratado como alguém

Vou me embora para Santa Rita do Passa Quatro
Vou me embora para Atrás da Pedra
Aqui as pessoas são infelizes e me deixam ainda mais
Lá ninguém fala coisas que não ocorreram sem vontade
Onde conheço José, Maria e seu Bicudo
Todos com seus chapéus de palha
Que nunca me viram antes
Mas são tão respeitosos como eu serei com eles


terça-feira, 25 de fevereiro de 2014

(EXTRA) Pensamentos em uma Caixa Cinza 8

Sede?
Eles te convencem tão facilmente
Você gosta de seus longos cabelos negros?
Você esta simplesmente cansada de sua tagarelice
Esta noite você se joga no tempo frio
Essa revelação me faz perder meus sentidos
Mas sua silhueta continua a ser daquela triste e jovem garota chorando
Embora você estivesse sendo tragada silenciosa e violentamente
Tudo o que sobra é um amor incompleto
Quando você o beija depois de terminar você é a única cujos olhos estão fechados
Ironicamente seu corpo nu esta seco
Alguém me molha...
Faça chegar agora!
Aonde o passado seria puro
Como dormir depois de transar
Eu quero só um pouco de paz
Não é o meu beijo que é seco
Faça descaso de mim
Ninguém espiaria meu coração se ele fosse vazio
Você as vezes se excita com palavras doces e doentias
Então somente quando você esta sonhando, ele diz o nome de outra garota em seu sonho
Veja! Você é só conversa também
Você esta em pânico?
“Não se preocupe, isso não me preocupa” você diz
Mas sua silhueta continua daquela triste e jovem garota chorando
Isso não será o “fim triste de nosso amor”
Romeu e Julieta estão mortos
Ele esta apenas brincando
Ele não se descuidou e disse a você como realmente se sentia
Ninguém pode tomar o lugar da assombração dela
Eu não vou mudar meu suposto coração vazio...
Para de um adulto
Eu digo adeus para o “eu” que estava aqui por você
Desde que eu decidi não te amar mais
Estou atordoado pela dor da perda
Você decidiu viver seca
Como a primeira amargura de um cigarro
Como o primeiro gole de vinho
Você esta aqui na minha frente e então percebi
Eu estava, apenas, fugindo da dor da perda

O que Delírio vê com seus olhos desiguais?
O dia nublado, cheio de pequenos pedaços de sol tocando o chão como pedaços de marshmallow.
Eu levanto com tanta dor maravilhosa que começa a machucar meus olhos que se encontram no estômago.
Ando pela avenida, com pernas em minha cabeça cheias de problemas de matemática que podem ser resolvidos por Freud.
Ando com um monte de zumbis e anjos na cidade que me deixam enjoado pela carnificina e o cheiro de galinhas.
Quero só viver sem ninguém me enchendo a paciência só por pentear meus cabelos com meu cutelo de cortar carne.
E ver os peixes dançando no ar junto com as borboletas em pleno ar de inverno.
Ah, como é lindo procurar as trevas na luz forte.
Dedicado a Camilla Campoi Sobral


Chovendo
Você não acredita, mas eu vejo azul para ti
Mesmo que me chame de falso ou dissimulado
Eu quero que essa verdade entre no seu coração
Mas você aceita tudo como mentiras
O meu coração é seu, só procure direito como eu lhe amo
Não quero lhe ferir minha doce criança pálida
Que mais parece um espírito da minha juventude
Aceito que você pisoteie as flores
Pois o ódio é só uma face amarga e tola do amor
Existe algo em mim que nunca perderá você

Dedicado a Camille de Souza Caruso

quarta-feira, 19 de fevereiro de 2014

(Parte 17) Capítulo Dois: Negro como a escuridão


Era Inverno. Todos colocaram peles grossas e espessas para resistir ao tempo frio. Foram concedidas pelos irmãos Wadonski para enfrentar aquele lugar, A embarcação sumia rapidamente sob a grossa força da neve que tudo encobria. Talvez o menos acostumado com tudo aquilo, fosse Gustavo. A terra de onde ele vem não era tão fria nessa época do ano. Isso explicaria o fato de seu povo ser muito caloroso em todos os sentidos, como muitos diziam. Um povo que agora só possuía um homem para assumir o trono. O paladino Salles.
E ele não queria saber sobre aquilo. Preocupava-se com Diogo, seu mestre. Ele ensinou os irmãos Salles. Mostrou que mais que uma arma, uma espada, deveria se tornar uma extensão de seu corpo. A arma deveria ser seu ataque e defesa. Mas acima de tudo, uma filosofia que exigia de seu usuário, a queda perante a arma de um inimigo que idolatre o mal. E lógico, a proteção dos mais necessitados. Isso nunca deveria ser esquecido. Quem lhe ensinou isso, agora não acreditava mais nisso. Havia um motivo para aquilo.
A terra em que Lacktum nasceu não era mais a mesma depois dos ataques dos homens que servem Kalic Benton. Aqueles que viviam na grande ilha eram muitas vezes pessoas de origem celta, agora viam que além de seus deuses, agora eram suas esperanças que acabavam pouco a pouco.
Caminhavam pela neve notando a grande dificuldade. E era mesmo. O lugar parecia que exigia uma dose dobrada de força para cada passo. Arctus sentia o peso em seu peito, pois já notava que a guerra dominava o território em que se encontravam. Thror notava chamas ao longe, que ele sabia, era a queimada das casas das vilas. Halphy reclamava do frio, apesar de já estar acostumada com isso. Seton nem ligava, fez uma magia em seu corpo para suportar a temperatura. O próprio Gustavo preparava tudo para não passar pelas enormes fogueiras que eles viam ao longe. Mas Lacktum se perdia muito mais em pensamentos, pois ele olhava para o norte com um olhar de nostalgia.
-Lacktum? – perguntou Gustavo.
-O que foi? – falou em resposta o mago, como se fosse tirado de um transe.
-Contornaremos as fogueiras, certo?
-Ah sim! Lógico...
Foi quando Halphy chegou próximo do ombro de Lacktum. Ele estava cheio de neve. Tirou um pouco do que estava no mago. Então ela olhou com ternura para o colega.
-Pensava nela?
-Em quem?
-Na mulher... Na sua amada?
-Lirah... Lirah Lugarao’Céu. Ela era linda. Assim como minha irmã. E minha mãe. Éramos felizes. Mas, sei que isso pode parecer obvio, mas como soube que eu pensava nisso.
Foi então que Halphy caminhou junto aos outros, e as pequenas criaturas que os acompanhariam. O cão se aproximou de Lacktum, enquanto os outros continuavam. Ele falou:
-Mago você falou que era inverno novamente... Com tanta frieza que nos gelou mais a alma do que esse clima. Não deve nem ter notado.
O ruivo continuou andando como se seu rosto estivesse cheio de gelo. Mas não era gelo. Ele se lembrou do que era feito um mago: determinação e nenhuma piedade.
Nesse meio tempo, Thror sentiu uma sensação que parecia conhecer a um bom tempo. Como se sentisse que alguém o vigiava. E isso não o incomodava. Parecia conhecer mesmo aquilo.

Caminhavam sempre contornando os pontos onde notavam as fogueiras inimigas. O que dificultava muito a chegada até o ponto que procuravam alcançar. Esse era o Portal de Ixxanon, onde pretendiam chegar. Para tanto teriam que cruzar todo o território inglês e por último chegar ao extremo norte das Terras Altas. Passando até pelo Vale das Esmeraldas, um território que era extremamente pouco conhecido, mas que possuía muitos mitos. Dizem que lá nasceu Wiegref Hinagawa e Galtran Coração Prateado, dois dos Imortais Esquecidos. Talvez até encontrassem o poderoso guerreiro e druida. Mas o que importava era não entrar em confronto direto com nenhuma das três tropas que serviam a Kalic Benton II.
A Aliança dos Mortos Despertos era formada por criaturas piores que os demônios que encontraram em Starten. Destruíam aldeias, devastavam em plantações, quebravam sonhos e retiravam dos homens e mulheres o que não tinham naquela existência: a vida.
Já os seres criados com a pesquisa de Paracelso, eram tropas de assalto criadas com o fim de eliminar os oponentes mais resistentes. Soldados eficientes que conseguiam impedir qualquer chance de vitória contra as tais tropas da Aliança dos Imortais. Os revenants pareciam que eram mensageiros da morte. O silêncio das armaduras quebradas por sons que pareciam choro, mas sabiam que aquilo não era possível. Cotas de malha não poderiam chorar.
Dificilmente conseguiram encontrar as tropas da Aliança dos Mestres do Martelo. Eles eram mais bem treinados do que todos os outros, e pelo que Arda havia comentado com os Dragões da Justiça, uma força maior que as outras duas alianças juntas. Os guerreiros do grupo que temiam o que fosse aquilo.
Além disso, era possível notar tropas de criaturas maiores. Eram ogros enormes e fedorentos, todos bem armados. Traziam pavor, equipados então, muito mais. Com certeza estavam do lado de Kalic Benton II, foi o que pode concluir Halphy como batedora do grupo.
Isso criava uma maior cautela nos Dragões da Justiça. Poderiam ser jovens até que preparados, mas nunca houve garantia de vencer os oponentes. Inclusive tropas bem armadas, A missão é alcançar o portal que ficava nas Terras Altas. E isso impedia perda de tempo em batalhas desnecessárias. O único que reclamava das lutas não travadas era Thror, falando que seus antepassados teriam vergonha de suas forças.
No final de alguns dias, o grupo teria atravessado boa parte do território inglês, sem nenhum problema. Mas iria demorar até alcançar as fronteiras do reino. E em algum momento, uma luta seria necessária.
Em uma determinada manhã, os Dragões da Justiça se prepararam para enfrentar um problema: estavam caminhando por uma planície, coberta de neve, mas ao longe poderia haver inimigos. A águia Fiel notou que surgiam não muito longe, membros dos Mestres do Martelo. Todos carregavam uma insígnia de Mallmor, aquele que invadiu a torre de Azerov. O grupo se mantinha escondido.
-Vamos contornar – disse baixo Lacktum.
-É um luta desnecessária, realmente – assentiu Arctus.
-Qual motivo de não enfrentarmos eles diretamente? – falou Thror, quase alterando o tom de voz.
-Calado Thror! Não nota o perigo que nos expõe? – advertiu Halphy como uma ama-seca que adverte uma criança.
-Bem, então contornemos – confirmou o líder dos Dragões.
Os membros foram muito calmamente, atravessando a planície cheia de neve. Os primeiros a fazer isso foram os animais, furtivos naturalmente. Logo em seguida foram à ladina, o mago e o druida, que não usavam nenhum tipo de proteção ou armadura pesada. Por último, o guerreiro grego, o paladino e o clérigo católico, atravessaram aquele local. Ou quase.
 Foi ouvido um estalo de madeira se quebrando as grevas do Salles. Ele olhou para Thror a sua frente e Arctus na sua retaguarda. Seria até engraçado, se não fosse à força daquele barulho na planície. Completado com o rosto de Gustavo cheio de angustia por delatar o grupo sem querer. Soltou só um contido:
-Perdão.

Os guerreiros anões começaram a cruzar o gelo. Eles notaram especialmente a parte do grupo com armaduras. Todos os soldados possuíam machados bem afiados e bem trabalhados. Estavam em número de cinco que investiram na direção do grupo de jovens.
Atacaram, principalmente, o paladino. Dois contra Thror, dois contra Gustavo e um contra Arctus.
O que não era esperado foi o golpe certeiro do guerreiro sem memória, pouco abaixo do braço que segurava um machado contra o anão. Esse perdeu a força com a arma, mas não desistiu do combate. Golpeou o grego no ombro e esse também não se desestabilizou.
Anões que golpeavam Gustavo tentavam o fazer cair, mas este se protegia com seu escudo e espada. Ele se mantinha defendendo os dois machados, até que retirou a espada da posição defensiva que manteve até então, para atingir a cabeça do anão, enquanto com o outro braço empurrava o segundo adversário. Numa seqüência rápida, Gustavo golpeou o peito do anão.
Arctus não possuía tanta sorte quanto os outros, sua maça não conseguiu atingir o seu oponente. E esse se aproveitou para golpear o sacerdote no rosto. Com mais precisão poderia perder o pescoço.
Foi quando o druida e o mago começaram a agir escondidos pela neve. O jovem Seton sacou um arco e sua respectiva flecha. Disparou o projétil como se quisesse atravessar o peito do não. E seu desejo se concretizou. Pois o anão que combatia Arctus sentiu uma forte dor nas costas. Mas permanecia rígido e de pé. Isso até Halphy lançar a adaga no seu corpo que já se contorcia.
Lacktum erguia suas mãos preparando uma magia. Porém, parecia que ele envergava um arco. De repente ele entoou:
-What this arrow fill the breast of my enemy. Like Art makes me.
De repente, o inimigo adjacente a Gustavo tombou por uma seta de energia fumegante. Em alguns instantes ela sumiu das costas do anão deprevenido.
Um dos anões que combatia Thror, então grita:
-Dalik! Há conjuradores entre eles!
-Esta bem Rufgar!
Mas era tarde. Seton lançou setas de madeira contra o peito do anão que tentou agüentar bravamente. Não obteve sucesso.
-Dalik! Não!
O anão foi em direção do aliado caído. Thror então viu uma chance de definir aquele combate gélido.
-Thror não mate! – gritou Lacktum.
Nesse momento, o diminuto guerreiro se lembrou que estava em combate. Mas quando se virou, só pode ver o cabo da poderosa espada de Thror acertando sua face, antes de tombar.
Lacktum colocou as mãos na cintura como sinal de desaprovação, enquanto saia de seu esconderijo na neve. Thror estranhou a reação do mago.
-O que foi? – o guerreiro falou – Eu o deixei vivo.
Foi então que o mago pegou o inconsciente guerreiro e puxou para perto de uma árvore seca devido ao inverno.
-Bem... Ao menos podemos obter informações preciosas para enfrentar o nosso inimigo... Como ele pesa...

Depois de um bom tempo, o anão despertou como se fosse um bêbado que despertava de uma ressaca terrível. Mas com certeza, uma cerveja não traria tanta dor quanto aquilo, para o guerreiro vencido. Tanto no corpo quanto no orgulho.
Lá estava ele, amarrado a uma árvore seca, desprovido de arma e armadura. Seus pés também não podiam se mexer. E ao seu redor havia cinco homens e uma mulher, além das figuras animais. A barba cheia de tranças mostrava que muitos verões ele havia visto e temia que perdesse a vida por meros filhotes humanos. E seria uma desonra maior do que a de ser capturado.
Thror conversava com Lacktum, quando notaram que o anão despertou.
-Ora vejam – com tom de sarcasmo o mago – ele despertou para nos contar algo. Não é?
-Do que falam? – perguntou o anão com ar de raiva.
-Você é membro das tropas que servem a Mallmor – falou Arctus como um ferrenho interrogador – Das três tropas que servem Kalic Benton II, os anões são membros da única que podemos extrair informações. E ao que parece você era o líder daquele esquadrão. O que significa que pode nos informar sobre algumas coisas...
-Em nome de Vossa Majestade Mallmor, não irão obter nada de mim!
Lacktum olhou para Thror. Esse entendeu rapidamente – coisa rara para o grego. Ele pegou pela barba do anão com uma mão, enquanto com a outra pressionava próxima do olho dele ferido. O anão agüentou bastante, mas até um homem resistente cede. Ele gritou de dor, muita dor.
Foi então que o mago gritou para o guerreiro:
-Chega Thror!
O grego cessou a tortura. Era engraçado que o mesmo Thror tão gentil poderia ser tão terrível. Ele fez sangrar o anão com sua poderosa mão. Mais um pouco, poderia perfurar permanentemente o olho do inimigo. Foi quando Arctus chegou até o anão.
-Qual o seu nome, anão?
-Rufgar... Meu nome é Rufgar – falou o guerreiro torturado.
Sua ferida de repente sumiu, graças a ajuda do clérigo. Esse por sua vez disse:
-Anão Rufgar... Diga a eles o que desejam e talvez sejam clementes contigo.
-Clementes? Um bando de humanos clementes? Isso é uma piada?
-Você esta vivo, não é? – soltou de forma acida Gustavo.
Surgiu um silêncio, cortado pelas palavras de Thror.
-Eu queria matar. Não me permitiram.
Rufgar olhou a todos e depois de muito pensar, falou que iria responder as perguntas. Mas somente por conta da piedade que o padre cedeu a ele.
Lactum perguntou como os outros exércitos eram controlados. Afinal, os mortos famintos e os revenants teriam que ser manipulados de uma forma arcana única.
-Os dois exércitos estão sendo controlados através de itens conhecidos como Lamterna dos Condenados.
-Lanterna? – soltou um curioso Seton.
-As Lanternas são itens copiados por alquimistas, de um artefato único de mesmo nome. Cada uma delas esta na mão dos lideres das alianças. Pois foi através delas que as almas são colocadas em receptáculos de carne ou em armaduras. Com esses itens, eles controlam as tropas.
-Certo – disse Lacktum – Já que é assim, como eles obtiveram o artefato original?
-Não sei – soltou Rufgar – Alguns falam que o item original era do mentor de Kalic Benton II. Mas não há certeza de onde ele surgiu.
-Espere – falou Arctus compreendendo algo – quer disser que os revenants são preenchidos com almas ou magia?
-Com almas – respondeu Rufgar – A Lanterna dos Condenados original controla forças necromânticas. Eu nunca entendi disso, mas compreendi que isso tinha haver com os mortos famintos.
Isso começou a fazer sentido nas cabeças de Halphy e Lacktum. Quando estiveram em Starten, um número muito grande de mortos famintos estava atacando a vila. Inicialmente, pensavam que isso tinha haver com os poderes arcanos do mestre secreto do Pacto de Guerra, mas agora isso poderia ter alguma relação com o artefato. Mas não importava naquele momento.
-Como sabe tanto disso? – perguntou desconfiado Gustavo.
Todos começaram realmente a estranhar as informações detalhadas de Rufgar. Mas Lacktum não se deixava enganar. Ele notava a verdade nas palavras proferidas.
-Nosso mestre – continuou o anão – nos permite saber tudo que ocorre em seu exército. Ele chama suas tropas e concede informações da batalha esporadicamente. Assim como entrava em lutas antes, podemos confiar nele para nos mostrar um futuro glorioso e sem mentiras.
-Até parece... – soltou Thror.
-Não ofenda Vossa Majestade!
Novamente, a devoção do anão ao seu líder o tornava uma peça única. Ele estava longe de qualquer um de seus compatriotas, e mesmo assim, se sentia motivado a proteger a honra de sua raça. Especialmente, ao que se referia ao Príncipe Negro dos Anões.
-Muito interessante – falou o sacerdote católico com a mão no queixo.
-Sabe o nome do mestre de Kalic Benton? – perguntou incisivo Lacktum. Ele queria obter mais coisas sobre o homem que começava a acreditar que era seu nêmesis.
-Nunca ouvi falar nem boatos ou rumores sobre tal ser – respondeu prontamente Rufgar.
-Agora surge uma pergunta que começa a não fazer sentido na minha cabeça: ao que parece, algum lugar no Reino da França, ou até além, é o verdadeiro objetivo desses batalhões. Então qual o motivo de mandarem suas tropas para cá? Não faz sentido!
Rufgar quis se calar. Essa informação parecia extremamente vital para a missão que cumpriam. Até então, não se acreditava que haveria a captura de algum dos soldados anões. Um erro tolo demais, alguns pensariam.
Foi quando Lacktum falou para Thror ser mais rude com o anão. Ele realmente foi. O pequeno Furta-Trufas e Halphy ficaram horrorizados com os golpes do grego no diminuto ser. Ninguém, nem mesmo Lacktum, se divertia com aquelas cenas grotescas. Mas elas eram necessárias. Aquilo poderia impedir uma guerra sem sentido. Será que era assim que os jovens deixam sua inocência de lado e se tornam algo parecido com soldados?
Após um longo período, ao quais os mais precavidos temiam ser encontrados pelas outras tropas, o pobre Rufgar ensangüentado começou a soltar o que conteve até agora.
-Esta bem! Malditos sejam! Espero que O Nada[1] devore as almas de cada presente aqui! – nesse momento, Furta-Trufas desmaiou de medo – Se querem saber o verdadeiro motivo de combater nessas terras, devem saber que esse reino esta sendo limpo para que haja uma exército poderoso. A maioria de nossas tropas se concentrava aqui desde o começo. Limpando o caminho com tropas invencíveis estaremos livres para o verdadeiro objetivo desde o começo. Roma.
-Isso explica os mapas que encontramos tempos atrás – fala Lacktum, como se solucionasse um fato estranho – Vocês pretendem usar a Inglaterra como ponta de lança para um ataque contra Roma!
-E já sei até parte até parte do plano. Eliminando uma grande quantidade de pessoas, teriam material corporal e espiritual. Corpos para seu exército de mortos famintos e almas para preencher as aberrações, conhecidas como revenants – falou o clérigo católico, completando os pensamentos do mago.
-As Lanternas devem facilitar o processo – pensou Seton.
-Eles contam com mais alguém? – soltou Gustavo.
-Como assim? – desconversou o anão.
-Não me engana com sua fala guerreiro – começou o paladino – O que você ainda não respondeu é quem obtêm informações para Kalic Benton II. Afinal, as três Alianças que servem a ele, não são formadas por nenhum grupo de espiões. Os mortos famintos e revenants com certeza não devem ter consciência para conseguir planejar nada. Os anões são combatentes em suas fileiras, dificilmente haveria arcanos entre eles... Quando mais espiões! E nem necessito argumentar sobre os ogros.
-Esta bem – falou Rufgar, concordando com o paladino de cabelos negros.
-E então.
-Foi o Bando do Tigre Demoníaco.

O Bando do Tigre Demoníaco era formado por mercenários que trabalhavam sempre pelo melhor preço. Conhecidos por terem obtido êxito, aonde outros jamais se arriscariam. O grupo era uma espécie de guilda que aceitava os mais diversos serviços, desde a proteção de reis e nobres, até os assassinatos de pessoas com a mesma importância. Isso sem contar, a obtenção de artefatos sombrios e a destruição de monstros presentes só em lendas. Eram mais conhecidos como uma lenda para assustar piratas no Mediterrâneo.
Seu líder e criador seria Hazik, conhecido por manejar duas espadas como uma só. Ele foi um homem que nasceu nas terras do Mediterrâneo, mas que aprendeu os ofícios da Arte e suas utilidades. E se interessou, principalmente pelas evocações demoníacas. Assim obteve um favor do demônio, que um dia libertou: viveria o dobro de qualquer homem, se concedesse sua alma ao Inferno.
Com tanto tempo – e poder que obteve em decorrência de sua vida estendida – o guerreiro criou o Bando do Tigre Demoníaco. O nome vinha da alcunha de Hazik, o Tigre Demoníaco de Um Olho Só. Ele havia perdido um dos olhos em um combate contra um homem de extrema habilidade. Nunca souberam se Hazik havia vencido esse combate.
Ele tinha o auxilio de alguns homens poderosos. Entre eles os nomes de Daubar, Yue Khan e Augustus. Daubar era o braço direito de Hazik, mais conhecido como o Outro Olho. Espadachim tão talentoso quanto seu mestre. Yue Khan era um monge, mas não era como os ocidentais, guiados por um deus e sim por uma doutrina que conseguia simular os poderes arcanos de um arcano, mas não perfeitamente. Já Augustus era uma sombra, um homem especializado em mortes, um assassino que aprendeu essa arte com homens do oriente.
Muitos admiravam esses homens, mas os sábios temiam a todos. Os demônios cobram caro demais.

Após o interrogatório, os dragões se entreolharam. O que fariam com Rufgar? Foi então que a resposta dessa dúvida recaiu sobre os ombros de Lacktum.
-Ele vai conosco. Pelo menos até cruzarmos toda a Inglaterra.
-Certo – disse Arctus muito satisfeito com a decisão do líder.
-Eu o mataria – disse Thror, sacando a espada curta.
-Me solte careca e então veremos quem mata quem! – gritou revoltado Rufgar.
-Parem os dois! – falou rapidamente o líder arcano do grupo, enquanto se abaixava para tratar com o anão – Nós não faremos mal a você. Então, por favor, entenda que não podemos lhe soltar no momento.
O anão consentiu dizendo:
-Que o Imperador dos Reinos Além das Nuvens lhe seja grato arcano
-Me chamo Lacktum, Rufgar.

Dias se passaram, e pelo que Lacktum se lembrava não faltava muito para chegar até as fronteiras. Estranhamente, Halphy sentia um tom triste na voz do arcano. Ela obviamente começou a ter certeza que o baronato de Van Sirian estava próximo. E as lembranças do líder começavam a ferir seu coração novamente. Era como o golpe exposto de um corte, que dói mesmo com o mais forte dos bálsamos.
Arctus em determinada noite, também notou isso no rapaz. O monge ouviu Thror, como Lacktum teria se unido ao grupo, e se compadeceu dele. Como um sacerdote, desde que se lembra, ele nunca sentiu dor por ser órfão. O fato de  ser cuidado pelos padres de um monastério, fez querer que as pessoas que ele conhecesse, fossem protegidas por ele. Ele não se iludia com chances de encontrar seus pais, só de fazer o bem no nome daqueles que lhe concederam a vida. O que fez temer também por seu colega de grupo. Mas sempre o mago se fechava em seus livros.
Naquela noite, Lacktum se fechou novamente nas folhas.
Um livro que Arda entregou a Lacktum. Era uma compilação do livro que foi entregue por Azerov. O próprio regente teria usado meios arcanos para compilar os escritos e não enlouquecer no processo. O pouco que leu, falava de enorme mal surgindo das estrelas. Mas nada trazia mais medo que outro problema para a ilha, pensava o regente. Então, preferiu entregar o livro a Lacktum, que sempre se interessou nos assuntos relativos ao velho caduco da torre, como ele mesmo o chamava. Talvez, até mesmo conseguiria compreender que forças estariam agindo naquele livro.
O acampamento improvisado foi montado como tantas outras vezes antes, enquanto Lacktum se afundava no livro. Todos conversavam, tomando cuidado para que ninguém notasse isso, nem a fogueira. Era um território inimigo ainda. Mas o problema eram as broncas de Halphy sobre Thror. Era engraçado ver a jovem meio elfa tentando fazer o guerreiro grego parar de beber. Hilário alguém diria.
Depois de certo tempo, o barulho então cessou e muitos foram dormi. Com exceção do homem que liderava o grupo. Este continuava lendo o livro, com muito cuidado. Enquanto lia, ouviu o seguinte:
        Ele quer a máscara para si...
-Como? – falou Lacktum antes de olhar ao redor, vendo que todos dormiam, incluindo o anão que haviam capturado. A voz parecia muito certa do que falava e extremamente familiar. O arcano sentia a verdade nas palavras que ouviu. Mesmo elas vindo do vazio.
Novamente surgiu na escuridão:
Ele quer obter ela para entregar a Mallmor... Ou pior
E então, o arcano se sentiu confuso mas sugestionado a acreditar naquelas palavras.
-Quem?
A voz sumiu por alguns instantes. E quando ele achava que não havia acontecido nada, a voz lhe trouxe um nome:
Rufgar
Foi então que o arcano notou o anão amarrado e amordaçado, próximo a uma árvore novamente. Ele dormia de forma desajeitada, mas na mente e no espírito de Lacktum, ele acreditava que era tudo fingimento de Rufgar, se é que esse era seu nome realmente. Algo o fazia desconfiar das atitudes do diminuto guerreiro agora. Era um homem que servia a Mallmor, o mesmo miserável que um pouco mais de um mês invadiu a torre de Azerov. Quem não poderia garantir que ele, de alguma forma, estaria entregando informações ao líder dos pequenos elementais da terra?
Estranhamente, de súbito, Lacktum levantou como um fantasma que surge de um terrível pesadelo. Havia fúria em seus olhos, afinal, ele sabia que um inimigo terrível poderia estar ali, com eles.
A mão crepitava com mana, a energia mística inerente em todos os seres e coisas existentes no universo conhecido. Ela estava preenchida com um pouco de energia negra e profana da necromância. Estava pronto para lançar o feitiço, quando Halphy o interrompeu, segurando pelo pulso do arcano.
Os dois se fitaram como se estivessem enfrentando um ao outro de modo pessoal. Era estranho, mas Halphy começava a sentir a magia inerente em si crescendo, e sabia que se fosse necessário enfrentaria o mago inglês.
-O que foi ruivo? – perguntou ela – Qual o motivo de preparar a magia contra esse anão?
-Como sabe que era contra Rufgar? – retrucou o inglês.
-Não tente me enganar Lacktum! Sou experiente o bastante para saber suas intenções!
-Eu... Eu não sei o que deu em mim... Desculpe Halphy...
-Você não tem usado aquela máscara dos diabos, não é?
-Não... Qual o motivo de me perguntar isso?
-Nada. Só pensei que pudesse estar a usando e por isso agia assim.
-Tudo bem... – mas logo que terminou de falar isso, golpeou o rosto da jovem ladina feiticeira. O som que o golpe proporcionou finalmente acordou alguns dos homens que dormiam. Arctus e Seton foram acudir a jovem ladina. Valente pulou para a perna de Lacktum de forma a o deter com mordidas, assim como Alexander. Ambos inúteis.
Gustavo já iria sacar sua arma, quando o poderoso grego quase quebrou o queixo do mago, fazendo este cair no chão com um barulho seco na neve. O paladino ergueu o corpo de Lacktum da neve então. Quando notou, viu um estranho volume na mão direita do companheiro ensandecido. Era o livro traduzido de Azerov.
-Mas o que diabos, ocorreu aqui? Que demônio se apoderou dele? – soltou Arctus.
Parecia que naquele lugar, um furacão teria passado. Rufgar olhava tudo, sem poder se expressar sobre o ocorrido. E foi então que Seton se lembrou de uma cena que o apavorou demais no passado. Estava se repetindo o que ocorreu na Grécia com Azerov, só que agora era com Lacktum!


[1] O Nada: como em culturas celtas e germânicas não existem demônios (como os da visão católica), O Nada seria uma personificação do mal nos mitos dos seres elementais.