sexta-feira, 16 de novembro de 2012

(Parte 6) Capítulo Seis: Se lembre



O navio havia atracado em um pequeno porto. Esse porto ficava perto de Delfos, antiga cidade que havia se unido com Esparta muitos séculos atrás na famosa Liga do Peloponeso, contra a Confederação de Delos. Mas não era isso que fazia o grupo ter chegado até aquele lugar.
Várias são as lendas que ditam sobre um homem em Delfos – ou algo parecido com um homem – que podia ouvir as Moiras e as tramas que elas faziam com o destino a seu bel prazer, com a finalidade de conceder um lampejo do futuro. Futuro quase sempre incerto ou com um mal incrustado.
Mas naquele momento, não era hora de pensar no futuro, mas sim momento para despedidas.
-Bem, - começou Joseph Boas Línguas com um rosto pesaroso – acho que isso é um até logo, não é?
-É – disse Halphy que demorou a continuar a frase, caçando as palavras – Acho que nos separamos até que o destino resolva nos unir novamente.
-Espero mesmo que o destino nos uma Halphy, - completou Gor – mas que nunca mais passemos novamente por aquela ilha. Perdão. Ah e tome seu pagamento – foi então que o inglês concedeu mais cinco gemas vermelhas, como aquela que concedeu ao capitão nas docas.
-Vocês que devem me perdoar. Mas saibam que se eu pudesse... Também não passaria naquela ilha. De qualquer forma... Au revoir!
E então, Joseph colocando os pequenos mais valiosos rubis no seu casaco de capitão, se virou em direção ao navio. Sua imagem em nenhum momento pareceu ser de um homem mórbido, pensaram os membros do grupo. Mais parecia alguém muito justo que se via forçado a uma situação que nunca quis estar. Por isso, pensaram os jovens, que talvez fosse o motivo de se sujeitar a aqueles ritos macabros.
Após tudo que passaram, chegariam à pequena vila costeira. No porto, estavam Gor, Halphy, Federick e Hugo. Thror tinha se adiantado por algum motivo. E Lacktum demorou a se unir ao grupo com um rosto de poucos amigos. Parecia não estar bem desde ontem, graças a um pesadelo que foi audível por todo o navio. Ele não sabia, nem foi comentado por bondade dos membros do grupo que gritava enquanto sonhava. Não havia muito que qualquer um dentro da embarcação poderia fazer por ele.
Lacktum tremia muito como se tivesse presenciado cenas terríveis, o que não estava longe da verdade. Mas querendo ignorar tudo da noite anterior, se manteve firme na direção dos companheiros.
-Onde esta Thror? – disse Lacktum, querendo parecer melhor.

Thror olhava em direção a uma colina, que nunca tinha visto, pensava ele. Porém, foi como em Starten. Ao mesmo tempo em que ele achava que não conhecia o lugar, algo em sua alma o trazia memórias fracas que logo desapareciam. Como nuvens de chuva. Era como, lembrar de algo, sem nem ao menos ter vivido aquilo.
A colina era íngreme, e árdua seria a escalada. Mas o grego acreditava que para si, não deveria ser difícil subir. Por incrível que parecesse, ele acreditava saber o que esperar. Ou ao menos achava.
Lá deveria estar o Oráculo de Delfos.
Os companheiros perguntavam na vila, se alguém sabia do Oráculo. A iniciativa foi de Federick. Lacktum iria começar a rir das atitudes do paladino, quando houve uma resposta positiva de uma mulher no meio daquela vila pequena. Ele sabia falar grego.
Federick era o único que sabia falar aquele idioma, além de Thror é lógico. Por isso mesmo, Gor perguntou o que a mulher falava.
-Ela disse que naquela colina fica o Oráculo. Mas é perigoso pelo que sabe. Afinal, ninguém nunca voltou de lá.
-Não deve ser tão perigoso, - comentou Gor – se comparado ao que sofremos em combates até agora.
-Bem, ela só quis avisar.
-Observem - disse Hugo apontando na direção da colina – Thror realmente se adiantou.
Olhavam um Thror atônito, que se fixava com o olhar na direção da colina. Ele tremia como uma caça diante seu predador fitando seus olhos sem compaixão, mas com extrema fome. Mas se Thror era o caçado, quem era o caçador?
Richard se aproximou, acolhendo em um abraço o guerreiro.
-Pode me dizer, o que te aflige grego?
-Eu não sei...
Federick, que passava por eles, ignorou as palavras de Thror, achando que aquilo poderia ser um medo infantil de alturas. E medo não era algo proveniente na alma de um servo de Cernunnos.

Os aventureiros, próximos a colina se encontravam e começaram a subir. Era mais íngreme do que imaginavam. Mas mesmo com esses problemas, conseguiam subir o lugar. Haviam vários espaços, feitos na parede, que foram usados para subir o enorme paredão que surgia diante deles. Com certeza, feitos por aventureiros anteriores.
Gor subiu primeiro, sem nenhuma armadura. Sabia como escalar aquelas formações muito bem, apesar de falar que não treinava escalar fazia muito tempo. O que muitos notavam era a felicidade do guerreiro subindo o lugar. Os outros tentavam subir com dificuldade, seguindo seus passos na formação rochosa. Mas era difícil. Gor se movimentava com rapidez como uma aranha fixada em uma parede. Enquanto isso, o teimoso Thror insistia em subir de armadura todo o paredão. Era engraçado ver as tentativas do grego sendo frustradas pelo peso da proteção que carregava nas costas e pelas pedras que se soltavam. Os outros eram auxiliados por Gor, que dizia que pelo menos o resto do grupo não era tão teimoso. Ainda assim, a dificuldade persistia.
Em certo momento, Federick quase caiu de uma boa altura. Mas então Gor estendeu sua mão esquerda, sendo que com a direita, segurava firmemente a corda.
-Arggh! Peguei – disse Gor usando sua força para segurar Federick – Mas fique atento. Não vou estar aqui o tempo todo.
Federick tentou se colocar ao lado de Gor no paredão de pedra que havia se tornado aquele lugar. Apoiado nas pedras, o paladino se segurou e pediu desculpas ao guerreiro inglês.
-Não sou acostumado – disse o cavaleiro sacro – Isso não é função de um paladino.
-É melhor se acostumar. Se lembre que muitas pessoas dependem do que faremos no topo dessa colina.
Gor então voltou a subir com a mesma facilidade de antes. Deveria ser muito experiente, pensou Federick, para reagir daquele modo, naquela situação. Não sabia muito pelo que seu mestre comentou, sobre ele. Queria ser, pensou o paladino, um pouco parecido com ele.
Enquanto todos subiam, o guerreiro grego esperava o auxilio. Depois de tantas tentativas, ele decidiu tirar a armadura. Ele enfim notou que era pesada demais. Mas até então, se machucou muito.
Por fim, o grupo se encontrava finalmente no topo da colina. Lá eles contemplavam o local onde se encontrava o Oráculo de Delfos.
 
Era bonito todo o lugar que viam. Várias colunas de mármore sustentavam uma estrutura de mesmo material. As colunas são bem espaçadas entre si e no centro da construção, no que seria o teto, havia um buraco de forma retangular que permitia a visão do céu. Havia escadas que desciam ao centro do lugar, que terminava em um terreno arenoso no qual havia uma enorme fogueira bem preparada, que crepitava e atingia as nuvens daquele dia nublado, com sua fumaça, brasas, labaredas e cinzas. Era possível sentir que a Arte era forte naquele lugar.
Lacktum moveu os braços em forma circular, arrastando linhas arcanas como se limpasse algo no ar. Ele então proferiu, calmamente, palavras mágicas:
-Show me the truth here. I reveal the Art in the air.
Nesse momento, Lacktum sentiu que o local emanava uma aura de adivinhação, tão forte, que ele mal agüentou a força que exalava. Sua concentração foi logo quebrada e a magia dissipada.
-Esse local, emana muito mana[1]! Demais para ser sincero...
-Bem nada vai acontecer – começou Thror – se ficarmos parados aqui.
Eles desceram os degraus e viram mais de perto a fogueira. E o grupo descendo as escadas, extasiado por toda a magnitude do lugar, ninguém notava que Gor dores que o faziam o andar com dificuldade. Ele notara aquilo precocemente: conhecia aquela sensação, como se sua cabeça quisesse mostrar que alguém estava ali. Alguém conhecido.

As lendas antigas contam sobre esses homens. Os oráculos. Homens que através dos deuses mais poderosos das antiguidades conseguiam os verdadeiros o tempo e espaço. Tão poderosos que superavam os poderes dos deuses comuns. Mas normalmente são tratados como mulheres. Para nós mortais, são conhecidas como Passado, Presente e Futuro. Em cada cultura eram nomeadas de outras maneiras. Elas eram chamadas de Moiras, Parcas, Nornas, Bruxas, Fúrias, Irmãs, Tecelãs do Destino, Juizas, entre outros nomes. E em algumas culturas possuem até nomes. Os gregos concediam os nomes de Cloto, Láquesis e Átropos. Entre os nórdicos eram chamadas de Urd, Verdandi e Skuld. E mesmo sendo de culturas diferentes elas representam praticamente a mesma coisa: passado, presente e futuro.
Alguns homens que se entregavam a contemplar as forças astrais se tornavam poderosos oráculos para guiar os homens em seus caminhos de vida. Entre alguns nomes estavam Tiresias, o adivinho cego, ou Calcas, o homem que morreu de tanto rir. Mas um dos mais famosos se chamava o Oráculo de Delfos. Tão poderoso que influenciou figuras das lendas e histórias gregas como Alcmeón, Ino, Tiestes, Hércules, Psiquê e Sócrates. Sua sabedoria era como uma chama que iluminava o mundo. O seu poder poderia contemplar uma fração do que as Tecelãs do Destino criavam para o mundo. E na frente do local onde o Oráculo se mantinha estava escrito uma das maiores verdades do mundo: conhece-te a ti mesmo.
E era isso que eles teriam que fazer ali.

Quando se aproximavam da fogueira notaram uma sombra se projetando de uma das colunas. Essa sombra possuía um manto negro com as bordas em dourado, estava cheio de runas estranhas. De dentro do tecido surgia um par de mãos pálidas e esquálidas. Era possível notar que estava nu debaixo do manto, mesmo que não fosse possível ver direito sua forma pela escuridão do lugar. Seus pés eram grandes e pareciam garras com a mesma brancura das mãos. Ele andava arqueado, porém parecia medir dois metros facilmente. Não era uma figura que se gostaria de encontrar sozinho.
Ele falou com a voz rouca como se uma faca atravessasse sua garganta:
-Bem vindos, Federick de Salles, homem do trono de terras distantes, Thror Tzorv, guerreiro e artífice da poli onde nasciam os espartanos, Halphy Brown, ladina ardilosa e arcana de sangue sidhe, Hugo Capeto, feiticeiro das terras romanas, Richard Naara, sacerdote das divindades celtas, Lacktum Van Kristen, filho de nobres que busca vingança, e Gor, grande guerreiro inglês que participou de varias guerras. Bem vindos.
Todos notaram o tom do sarcasmo que o homem usava para eles. Mas não era momento para enfrentamentos. Eram necessárias respostas.
-Quem é você? – inquiriu Federick sem medo, como de costume.
-Ora, não sou eu a quem tanto procuram? Não foi por mim que se deslocaram de Starten, no Reino da França, até Delfos? Sou o homem que fala com as Bruxas do Tempo, as Senhoras Negras do Destino. Sou o Oráculo de Delfos.
Ninguém falou ou gesticulou um movimento. As chamas então crepitaram com força como as chamas de um dragão. Ele continuou:
-Me acompanhem ao outro salão. Lá observarão algo que irá criar uma noção do futuro.
-Mas... – tentou falar Lacktum.
-Me acompanheeem – disse com a voz arrastada e seria o Oráculo.
Ele se arrastava , assim como sua voz, até o outro salão. Lá, além do chão cheio de areia, havia seis estruturas esféricas apoiadas por duas pernas de madeiras no solo. Havia ainda nelas molduras, e no seu centro, algo que conseguia refletir as imagens de quem passava próximo delas. Quando mais próximo das figuras, maior elas ficavam.
Lacktum já notara o que era.
-Já ouvi falar sobre isso. É um material criado pelos sarracenos, feito a partir de areia. O chamam de vidro.
Enquanto todos adentravam o salão, com a finalidade de observar os itens orientais, o Oráculo parecia se regozijar com algo inexplicável. Ria sem motivos, era o que pensava boa parte do grupo.
-Também já ouvi falar, - Halphy completou, ignorando a bizarra risada – e na verdade é uma substância solida. Ela possui a propriedade de refletir e expandir imagens.
Do alto da escada via todos. Lacktum ignorava o próprio reflexo, enquanto Halphy se olhava com prazer. Thror e Federick discutiam sobre o tal material: o grego dizia que aquilo era magia antiga, enquanto o paladino afirmava que não passava de uma criação de sarracenos com extrema perícia como Lacktum acabará de explicar. E Richard e Hugo olhavam atentamente a tudo.
Os companheiros de viagem nem notaram a falta de Gor no salão.
Foi então que Lacktum voltando ao seu habitual tom de superioridade – que havia sumido devido ao pesadelo – gritou ao Oráculo.
-Qual o motivo de estarmos aqui? Por acaso esses objetos nos revelarão o futuro? Não usei nenhuma magia de detecção nesse salão, mas tenho quase certeza que aqui não reside nenhuma magia de adivinhação.     
-Silêêênciooooo arcaaano! – gritou furioso o Oráculo de Delfos – Se fosse tão sááábio saberia que esse lugaaaar não possui nenhuma magia de adivinhação, mas sim de conjuração.
Foi então que Lacktum se deu conta. Olhou em direção aos objetos esféricos e se deu conta de que a magia que foi colocada neles poderia ser outra. Mas o que seria. Nesse instante colocou a mão no queixo pensativo. Ele então notou coisas que o deixaram alarmado. Primeiro, viu runas nas molduras que significavam duplicata e segundo, o reflexo no espelho não colocou a mão no queixo.
-Vocêês passarão por um desafio antes de constaaatarem o futuro.
-Saiam da frente dessas coisas seus tolos! – gritou furioso e preocupado o arcano, sem nem notar que ele mesmo passara na frente de um – Há magias preparadas neles!
Era tarde demais. Os tais espelhos começavam a vibrar como se fossem as ondas de um rio ou de um mar bravio. Lacktum viu sua mão atravessando as ondas do espelho. A mão de um Lacktum, igual em todos os detalhes físicos.
 
Halphy que se olhava atentamente tomou um susto que quase a fez cair para trás. Em um momento, olhava o próprio rosto refletido no espelho, em outro, a imagem de si mesma a encarava com ar de seria.
Federick e Thror se entreolharam por um instante, quando viram seus rostos em outros seres que não eram eles... Exatamente.
Hugo e Richard, mais atentos se preparavam como uma dupla de amigos que, até então, se mostravam ser. Enquanto Hugo ficava na frente, estendo as mãos em concentração mágica para os reflexos, Richard preparava a assistência no combate.
Os reflexos portavam os mesmo itens que os aventureiros. Tinham as mesmas armas e pareciam manejar elas tão bem quanto seus donos originais. Sendo reflexos era possível notar pequenas diferenças entre eles e os jovens: em sua pele, eles tinham um tom acinzentado que contrastava com os originais; seus modos e atitudes pareciam ser diametralmente opostos aos originais. Até mesmo os rostos parecidos sempre mostravam suas diferenças em sentimentos.
Enquanto Halphy mostrava um sorriso malicioso – mesmo surpresa – e maligno, seu reflexo demonstrava seriedade e confiança ao apontar a besta de mão. O mesmo ocorria com todos os outros.
O reflexo de Halphy atacou com sua besta. Dois virotes chegaram próximo do pescoço. O que seria morte certa se tivesse a acertado. Porém, Halphy nunca foi alguém de se entregar pelo susto e também usou a besta de mão que possuía. Com isso acertou a perna de seu alvo.
O guerreiro grego foi um dos primeiros a sacar a espada. Mal o oponente atacou e o sangue jorrou do falso Thror. O oponente riu de satisfação do golpe, quase que com um mórbido prazer. E sacando a espada gritou:
-Por Ares, sangue será derramado!
-É! – concordou Thror – E ele será seu por usar o nome de meu deus em vão! Ele guia só os fortes e rígidos!
E desviando do ataque que vinha do alto feito pelo seu reflexo, Thror aproveitou a brecha na luta e enfiou a espada na barriga do oponente. O reflexo gemeu de dor e caiu ao chão, se tornando pó.
Já Lacktum, estava com olhos cheios de fúria. Preparava uma magia se afastando do reflexo, quando este soltou:
-Create a great deal of energy! Fiery enough get a life!
Com isso surgiu um raio de energia, como um chicote, na direção de Lacktum. O golpe arcano não acertou em cheio o mago, mas mesmo assim o feriu gravemente. Como uma resposta ao ataque, Lacktum soltou então sua magia:
-That art becomes weapon for my victory. May your strength give me the real power.
O golpe acertou seu alvo, mas não foi fatal. Pois da palma da mão de Lacktum, saltou uma pequena seta de pura energia metamágica. E como uma pequena faca lançada no ar, atravessou o peito do inimigo, explodindo em uma nuvem de energia.
Seu reflexo parecia que tinha olhos menos vingativos. Pareciam ser bons, justos e sem raiva. Como se nunca tivessem sido corrompidos pelo mal do passado de um Van Kristen. Tudo aquilo que o jovem arcano perdeu.
-Van Kristen! – disse a replica – Não prossiga com sua vingança! Isso trará mais do que imagina...
-Eu vim de muito longe para voltar atrás! E se você realmente possuir parte de minhas memórias, como parece, sabe muito bem disso! Nem eu mesmo poderei parar o que esta para acontecer!
Enquanto isso, Hugo e Richard tinham tudo sob controle. O primeiro preparava uma magia cuidadosamente, enquanto o segundo já conjurou uma coruja para atrapalhar os oponentes refletidos. E quando estes os reflexos se viram livres do animal voador, viram o ar ser riscado por uma faixa de luz arcana.
-Saia da frente Richard!  Cio che emerge dalle me mie mani magiche. Come un fiamma viva.
A chama tomou conta das mãos de Richard e preencheram o espaço de suas cópias. Elas queimaram então com facilidade, sendo reduzido a pó.
Federick era o mais aflito entre todos. Afinal, não derrotou seu reflexo rapidamente como Thror ou poderia ser tão engenhoso como Hugo e Richard. Ele estava com problemas em relação ao seu combate com o reflexo e já havia sido ferido.
-Então príncipe – começou a falar rindo reflexo de Federick – o que vai fazer? Desistir de combater? Vamos Federick... Não banque o bravo... Não para mim... Ou já se esqueceu de seu irmãozinho?
Federick então segurou com tamanha firmeza sua espada, que homem algum poderia lhe tirar a arma. Recitou então as seguintes palavras:
-Minha espada é a ruína do inimigo! Os demônios perecem sob seu fio! Em nome de Cernunnos e Ceridween volte ao mundo que lhe pertence criatura do mal!
Foi quando a lamina do paladino se encheu do brilho de sua alma. Um brilho azul cálido e vibrante, como pequenas fadas na empunhadura da arma cobriam toda ela. E então esse brilho riscou o corpo refletido, o acertando em pleno ar.
O reflexo gritou. Sua dor era angustiante, mas ele parecia possuir uma vitalidade única. Vitalidade essa, que fez a copia sobreviver ao golpe destrutivo.
Halphy conseguiu enganar seu reflexo. No momento em que ele viu a ladina original vindo em sua direção, se abaixou prontamente para não sofrer o ataque preciso. Mas com um salto, a ladina obteve as costas de sua inimiga livres para um golpe certeiro. Um golpe extremamente letal.
-Argh! – gritou o reflexo pela dor tremenda causada pelo virote que Halphy segurava contra o seu pescoço – Não faça isso. Você ainda se arrependerá de estar trilhando esse caminho.
-Quem se arrepende é fraco – falado isso, mais um deles se tornou nada mais do que parte do chão do lugar – Bem mais um se foi. Faltam dois.
E era isso que Lacktum estava prestes a resolver. O arcano se colocava numa pose de superioridade contra sua copia, apesar dos ferimentos. Esfregando as mãos novamente preparava uma nova seta de energia, quando ouviu seu reflexo recitar.
-Come to me under the salamander. Powers of the elementals of fire defend me.
Então se viu surgir chamas das palmas do falso Lacktum. Uma pequena chama que se tornou fogo vivo, na forma de um tufão que cobria uma boa parte do salão. Quase atingindo outros no lugar. Mas diferente do arcano ruivo ele se preocupava com a vida de seus companheiros. O reflexo foi bem sucedido em termos, já que Lacktum foi realmente atingido, mas a língua de fogo só acertou sua perna, o que significava que ainda tinha condições de lutar. O reflexo então bateu as mãos como gesto para a magia cessar. Assim todas as chamas sumiram, como se uma vela que acabou de se apagar.
Quando a luz do lugar diminuiu, o reflexo constatou como tinha sido tolo. Ele não quis afetar os companheiros de Lacktum, mas acabou por não reparar que o jovem mago preparava um ataque com a besta. O original tinha satisfação no olhar.
-Te vejo no Inferno!
Novamente um virote zuniu pelo lugar. O peito da copia havia sido trespassado pela seta, assim como uma espada atravessa tecido fino. Lacktum viu seu reflexo cai ao chão se espatifando em vários pedaços e depois se tornando pó puro. Então ele pode reparar na dor que afligia sua perna. Parte do tecido havia se fixado na perna do arcano a devido alta temperatura da magia. Ardia demais aquele golpe de fogo também.
-Maldito! – falava enraivecido o jovem enquanto colocava a mão na queimadura.
Agora Thror iria ajudar Federick. O paladino continuava com dificuldade em derrotar o oponente, pois o golpe que sofreu sangrava muito e o deixava cada vez mais fraco. Quando o reflexo se preparava para golpear o guerreiro sacro, sentiu o aço cortando em forma vertical, entre o ombro e a cabeça. Quando isso ocorreu, foi possível ver que eles não tinham órgãos. Eles eram puro reflexo, puro vidro.
Foi então que algo ocorreu: as criaturas refletidas começaram a se esvanecer. Como se nunca estivessem estado ali. Mesmo aqueles que se tornaram pequenos montes, como foi o caso da copia de Thror.
Quando o bater de armas terminou, os jovens aventureiros puderam respirar aliviados. Todos colocavam suas armas em suas bainhas ou aljavas, e reparavam o dano sofrido no combate. Foi realmente difícil uma batalha contra eles mesmos.
O paladino Salles então foi agradecer ao grego Tzorv:
-Muito grato guerreiro! Nunca pensei que viria em meu auxilio. Pensei que tivesse algum tipo de desavença comigo. Apesar de sermos diferentes, como o reconheceu tão rápido?
-Hein!? – esbravejou o grego em uma careta mal feita – Hã! Acho que foi pura sorte mesmo.
Federick se lembrou que não lidava com um espírito comum. Era uma criatura que tinha na batalha seu maior prazer. Saiu de perto de Thror em seguida. Ele ignorou o guerreiro da cicatriz por um bom depois disso.




[1] Energia usada nas magias. Podem ser de origem arcana (que provém o poder através de sua vontade) ou de origem divina (que é a energia cedida pelos deuses).

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